Em julho de 2022, a Fundação RYR1 promoveu o Workshop Internacional de Pesquisa sobre Doenças Relacionadas ao RYR-1: Dos Mecanismos aos Tratamentos, foi o primeiro workshop internacional de pesquisa dedicado exclusivamente às doenças relacionadas ao RYR1 . O evento reuniu 45 pesquisadores presenciais e 10 virtuais de 11 países diferentes, todos envolvidos em pesquisas na busca de tratamento das doenças relacionadas ao RYR1, RYR1-RD (veja a galeria de imagens do evento). Sob a coordenação da co-diretora Brentney Simon, fui convidado, juntamente com um time de 10 indivíduos afetados por RYR1-RD para compartilhar nossa vivência, conhecimentos e interagir com os presentes. O objetivo científico do workshop foi promover um fórum que unisse os principais especialistas internacionais em doenças RYR1 (pesquisadores, clínicos e geneticistas) com indivíduos afetados, familiares e defensores de pacientes para compartilhar conhecimento, trocar ideias, formar colaborações e desenvolver novas estratégias para encontrar terapias eficazes.
Além do mais, nosso time desenvolveu e conduziu uma pesquisa com aplicação on-line, dirigida a 227 indivíduos, permitindo que pessoas afetadas por RYR1-RD tivessem suas vozes ouvidas através dos dados coletados. Nossos esforços foram tão bem-sucedidos que a Dra. Nicol C Voermans (Department of Neurology, Radboud University Medical Center, The Netherlands - click aqui e conheça seu histórico), uma das cientistas presentes, convidou Brentney para colaborar com sua equipe para compartilhar esses insights com profissionais médicos, além da comunidade RYR-1, na forma de um Artigo de Pesquisa.
Estou muito orgulhoso de ter feito parte deste importante projeto, dado sua importância médico-científica, à medida que o mesmo poderá contribuir nos avanços em busca de tratamento para as doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RD).
Confira a seguir a publicação original (click no link ) ⇒ https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39150833
....ou a publicação original em pdf ⇒ https://content.iospress.com/download/journal-of-neuromuscular-diseases/jnd240029?id=journal-of-neuromuscular-diseases%2Fjnd240029
.... ou confira a seguir nesta postagem, a tradução e adaptação para a lingua portuguesa da publicação entitulada "INDIVÍDUOS E FAMÍLIAS AFETADAS POR DOENÇAS RELACIONADAS AO RYR1 - A PERSPECTIVA DO PACIENTE/CUIDADOR".
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Publicação em 13 Julho de 2024
Resumo Histórico e objetivo: Variantes patogênicas do RYR1, o gene que codifica o principal canal de liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático (RyR1) com um papel crucial no acoplamento excitação-contração da célula muscular, estão entre as causas genéticas mais comuns de distúrbios neuromusculares não distróficos. Recentemente, conduzimos um estudo via questionário com foco em deficiências funcionais, fadiga e qualidade de vida (QV) em pacientes com doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RD) em todo o espectro de doenças reconhecidas. Neste referido estudo via questionário, a perspectiva médica foi adotada, refletindo um protocolo de estudo projetado por neurologistas e psicólogos. Com este estudo em questão, queríamos abordar especificamente a perspectiva do paciente.INTRODUÇÃO
Variantes patogênicas do RYR1, o gene que codifica o principal canal de liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático (SR) (RyR1) com um papel crucial no acoplamento excitação-contração (ECC) nas célular musculares, são uma das causas genéticas mais comuns de distúrbios neuromusculares não distróficos. As variantes patogênicas do RYR1 dão origem a uma ampla variedade de doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RD) que se apresentam ao longo da vida, variando de miopatias congênitas de início precoce a manifestações episódicas na idade adulta, incluindo hipertermia maligna durante anestesia e rabdomiólise por esforço em indivíduos que de outra forma seriam amplamente saudáveis [1, 2]. Esse amplo espectro clínico associado ao RYR1 é devido ao impacto funcional altamente variável de diferentes variantes patogênicas do RYR1, modo de herança, bem como tipo e localização de mutações específicas.
Recentemente, conduzimos um estudo via questionário com foco em deficiências funcionais, fadiga e qualidade de vida (QV) em pacientes holandeses exibindo todo o espectro clínico de RYR1-RD [3]. Pudemos demonstrar que tanto o RYR1-RD permanente quanto o episódico estão associados a um impacto substancial da doença, caracterizado por limitações funcionais e fadiga grave, resultando em perda significativa da QV. Os resultados deste estudo aumentaram a conscientização e o reconhecimento dos sintomas típicos em indivíduos afetados por RYR1-RD. Além disso, o estudo também melhorou o gerenciamento do paciente e definiu áreas específicas que precisam de mais pesquisas, particularmente sobre o impacto da doença associado a esses distúrbios neuromusculares comuns.
A perspectiva adotada no estudo de questionário anterior foi a perspectiva médica distinta, refletindo um protocolo de estudo elaborado por neurologistas e psicólogos. Muitos clínicos, no entanto, permanecem em grande parte inconscientes do impacto do RYR1-RD na vida diária de seus pacientes e de suas expectativas em relação a tratamentos futuros. Esses aspectos estão gradualmente se tornando um tópico de pesquisa em outras doenças neuromusculares [4, 5], mas ainda não foram abordados no RYR1-RD. Para abordar essas questões, os membros da RYR-1 Foundation, uma associação internacional de pacientes dedicada ao RYR1-RD, iniciaram uma pesquisa online antes de um workshop científico e da conferência internacional de pacientes dedicado a essas condições. Os resultados desta pesquisa demonstram a forte necessidade do paciente de compartilhar suas perspectivas em primeira mão com os principais especialistas internacionais em RYR1.
O “RYR-1-Related Diseases International Research Workshop: From Mechanisms to Treatments”, realizado de 21 a 22 de julho de 2022 em Pittsburg (PA, EUA), foi o primeiro workshop internacional de pesquisa liderado por pacientes dedicado exclusivamente ao RYR1-RD [6]. O objetivo científico do workshop era fornecer um fórum que conectasse os principais especialistas internacionais em doenças RYR1 (pesquisadores, clínicos e geneticistas) com indivíduos afetados, familiares e defensores de pacientes para compartilhar conhecimento, trocar ideias, formar colaborações e desenvolver novas estratégias para encontrar terapias eficazes. Objetivos adicionais eram desenvolver recomendações de consenso para prioridades clínicas/de pesquisa, identificar itens acionáveis necessários para levar o campo adiante e fornecer uma plataforma para os estagiários se envolverem com pacientes/familiares de RYR1 e líderes estabelecidos no campo. Durante este workshop, a equipe do estudo apresentou os resultados da pesquisa on-line e convidou doze pacientes a apresentarem seus depoimentos sobre viver com RYR1. Este manuscrito descreve os resultados da pesquisa do paciente e dos depoimentos individuais, usando uma abordagem de métodos mistos; empregando uma análise quantitativa da pesquisa e uma análise qualitativa dos depoimentos.
MÉTODOS
Equipe de estudo
A equipe de estudo que projetou e executou a pesquisa consistiu em 14 indivíduos, incluindo indivíduos afetados, familiares e defensores preocupados com RYR1-RD. Três desses indivíduos (DH, BS, JR) participaram de reuniões virtuais de especialistas científicos e médicos (AS, RD, NV) envolvidos no planejamento e organização do workshop internacional (de novembro de 2021 a junho de 2022).
Plano da pesquisa on-line
A equipe do estudo discutiu uma série de tópicos, com base no que ouviram de diferentes pacientes em discussões internas na RYR-1 Foundation, para gerar o primeiro conjunto de perguntas para avaliar e entender os desafios diários enfrentados por indivíduos que vivem com RYR1-RD. O conjunto resultante de perguntas foi posteriormente discutido com os especialistas científicos e médicos para avaliar as perguntas mais relevantes e chegar a um consenso sobre as perguntas finais com base na importância e relevância clínica. Isso resultou em uma pesquisa de 21 perguntas cobrindo cinco temas diferentes: Demografia (1–3); Diagnóstico (4–9); Sintomas e impacto da condição (10–12); Atividade física (13–16); e Pesquisa e estudos clínicos (17–21). A pesquisa completa está incluída como Dados suplementares A: Pesquisa on-line.
Esta pesquisa usou um design transversal descritivo e estava disponível para todos os indivíduos com RYR1-RD que atendiam aos critérios de inclusão por meio da plataforma de pesquisa on-line 'SurveyMonkey'. A pesquisa esteve ativa de 9 de maio a 25 de junho de 2022. Os critérios de inclusão incluíram: 1) Ter recebido um diagnóstico médico de RYR1-RD; e 2) Ser capaz de entender e escrever em inglês. Para indivíduos <5 anos de idade, os pais ou responsáveis legais foram convidados a responder à pesquisa. Indivíduos entre 5 e 17 anos foram convidados a envolver seus pais ou responsáveis legais para responder às perguntas.
Uma abordagem de amostragem proposital foi usada, e os quadros de amostragem incluíram: páginas do Facebook (FB), Twitter e Instagram da "The RYR-1 Foundation", "ryr1.org"; grupo do FB "RYR-1 Families"; página do FB "Living with RYR-1- Support Group"; página do FB "Central Core Disease & Minicore: a place for support, learning & friends" e lista de e-mail da The RYR-1 Foundation. As instruções específicas fornecidas foram: "Forneça o melhor palpite se você não tiver certeza absoluta"; e ‘Pule qualquer pergunta que você não queira responder’. Os participantes foram informados de que o objetivo da pesquisa era ajudar pesquisadores e especialistas a aprender mais e entender melhor o impacto de viver com um RYR1-RD, e ajudar pesquisadores a desenvolver novas estratégias para identificar e avaliar terapias adequadas.
Convite e instruções para depoimentos
Primeiramente, os pacientes que são membros da RYR1 Foundation foram convidados por e-mail. Daqueles que relataram estar interessados e da equipe do estudo, os participantes foram selecionados com base na idade, sexo, raça e tipo e gravidade do diagnóstico para representar uma ampla gama de indivíduos afetados por RYR1-RD. Essa seleção foi feita pelos pacientes que participaram do grupo de estudo. Um grupo de 12 indivíduos que foram direta ou indiretamente afetados por um RYR1-RD foram convidados a fornecer breves depoimentos (cerca de 7 minutos) durante o workshop internacional que resumem sua perspectiva sobre como é viver ou cuidar de alguém com RYR1-RD. Esses indivíduos foram instruídos a falar sobre o processo de diagnóstico, sintomas e impacto do RYR1-RD em sua vida diária, bem-estar físico e mental, seus tratamentos passados e atuais e expectativas de pesquisas futuras. Os participantes foram encorajados a incluir experiências, preocupações e ideias específicas para pesquisadores e especialistas médicos. As instruções escritas para os depoimentos são adicionadas como Dados suplementares B: Instruções para depoimentos.
Considerações éticas
As informações foram coletadas sem pedir aos entrevistados que revelassem suas identidades. Consequentemente, as informações enviadas não foram consideradas informações de saúde protegidas. Portanto, o Health Insurance Portability and Accountability Act (WMO)* não precisou controlar o uso dessas informações. Apesar disso, a RYR-1 Foundation manteve salvaguardas rígidas para proteger as informações do paciente de uso ou divulgação que não sejam consistentes com seus objetivos. Além disso, os autores realizaram aquisição, análise, interpretação e publicação de dados de acordo com as diretrizes de boas práticas clínicas da Radboud University Medical Center. Finalmente, o Radboud Research Ethics Committee considerou esta pesquisa não sujeita ao WMO (2024-17388).
Armazenamento e análise de dados
Dados quantitativos. Os dados da pesquisa foram armazenados anonimamente em um arquivo Excel e, posteriormente, transferidos para o SPSS. Estatísticas descritivas foram predominantemente usadas para caracterizar os dados (SPSS versão 27, IBM, Armonk, Nova York). Os gráficos foram preparados no software Graphpad Prism versão 9.5.0 (Graphpad Software, San Diego, CA, EUA). Os testes rho de Spearman foram usados para avaliar a relação entre sintomas, entre estado de deambulação e sintomas, idade do diagnóstico e sintomas, e estado de deambulação e frequência de exercícios. Os participantes também foram divididos em duas faixas etárias para comparar crianças a adultos (idade até 17 e ≥18 anos). Uma correção de Bonferroni foi aplicada para neutralizar múltiplas comparações entre os diferentes grupos de doenças RYR1-RD. ANOVAs unidirecionais foram usadas para comparar os diferentes RYR1-RD com relação ao número e tipo de sintomas físicos e psicológicos.
Dados qualitativos. Os pacientes que apresentaram seus depoimentos foram pseudoanonimizados: nas transcrições e análises, apenas os números dos participantes foram usados. Coletamos dados demográficos dos participantes, incluindo idade, sexo, diagnóstico e papel na comunidade de pacientes (paciente/pai/outro cuidador). Todos os depoimentos foram gravados em áudio. Os depoimentos que foram apresentados apenas verbalmente (n=9/12) foram transcritos na íntegra. Todos os depoimentos escritos foram complementados com informações adicionais das gravações. Os depoimentos escritos e transcritos na íntegra foram carregados no software Atlas-ti versão 8.1 e analisados usando uma análise temática [7, 8]. A análise temática é um método para identificar, analisar e relatar temas dentro dos dados [9]. Dois pesquisadores (LS e NV) analisaram os dados de forma independente por meio de um processo de comparação e raciocínio indutivos, partindo dos dados e do objetivo e não de teorias preexistentes. Esse objetivo era obter uma melhor compreensão da vida de um paciente afetado por um RYR1-RD, e expectativas e desejos em relação ao futuro. Os dois pesquisadores buscaram independentemente as unidades básicas de significado segmentando os dados e dando a esses segmentos rótulos conceituais que estavam intimamente relacionados às palavras dos participantes (codificação aberta). Ambos os autores compararam e discutiram esses códigos até chegarem a um consenso. Em seguida, eles identificaram relações entre os códigos abertos e agruparam esses códigos referentes ao mesmo fenômeno em categorias (codificação axial).
As categorias estavam parcialmente sobrepostas aos temas da pesquisa: Diagnóstico; Sintomas e impacto da condição; Tratamento e Expectativas. Para os temas principais, subtemas foram criados (vida antes do diagnóstico, diagnóstico, sintomas, efeito no funcionamento físico, efeito na vida diária, efeito na saúde mental, tratamento, expectativas e obtenção de conhecimento) e com três pesquisadores (LS, SC, NV) as citações mais significativas foram selecionadas por subtema que melhor representava os temas.
RESULTADOS
Um resumo conciso dos resultados da pesquisa e dos depoimentos foram incluídos no relatório do workshop [6]. Apresentamos aqui o conjunto de dados completo, começando com os dados quantitativos seguidos por dados qualitativos sobre os seguintes temas: 1) Diagnóstico; 2) Sintomas e impacto da condição; 3) Atividade física; 4) Tratamento; 5) Pesquisa e estudos clínicos e 6) Expectativas. Os temas 1 e 2 foram rediscutidos tanto na pesquisa quanto no depoimento. Os temas 3 e 5 foram discutidos apenas na pesquisa e os temas 4 e 6 apenas nos depoimentos. Nos depoimentos, todos os temas foram divididos em diferentes aspectos-chave.
RESPOSTAS
Pesquisa - A pesquisa foi respondida por 227 pacientes, pais ou outros cuidadores (143 mulheres e 84 homens). Para as perguntas que não foram respondidas por todos os participantes, é indicado quantos pacientes responderam às perguntas. As idades dos participantes variaram de 1 a 85 anos, com média de 37 ± 21 anos.
Depoimentos - 12 depoimentos foram apresentados durante o workshop. Nove deles foram fornecidos como texto escrito e complementados com a gravação de áudio, e os outros três estavam disponíveis apenas como gravação de áudio e transcritos na íntegra. Os dados demográficos dos participantes que forneceram os depoimentos são apresentados na Tabela 1. A análise qualitativa resultou na seleção de 215 citações, refletindo os quatro temas principais (Tabela 2).
Abaixo, descrevemos os resultados da pesquisa seguidos pelos resultados dos depoimentos de acordo com os principais temas de cada ferramenta de coleta de dados, conforme explicado na seção de métodos. Números de pacientes e porcentagens são relatados na pesquisa. Os casos em que nem todos os participantes responderam a uma pergunta específica são explicitamente indicados.
DIAGNÓSTICO
Resultados da Pesquisa - A seção de diagnóstico da pesquisa consistiu em seis perguntas. A idade dos entrevistados no diagnóstico foi variável, variando de 1 a > 60 anos. 22% dos participantes declararam que foram diagnosticados com RYR1-RD antes dos 5 anos de idade (Fig. 1). Os pacientes foram diagnosticados apenas por testes genéticos (n = 99/227,44%), por biópsia muscular e testes genéticos (n = 85/227,37%), ou apenas por biópsia muscular (n = 28/227,12%). Em um pequeno subconjunto de casos, o diagnóstico foi presumido com base no fenótipo e na presença de um parente de primeiro grau afetado com diagnóstico confirmado de RYR1-RD (n = 6/227,3%). Oito pacientes (4%) indicaram outras combinações dos modos de diagnóstico acima mencionados e um paciente não indicou o modo de diagnóstico.
Houve uma ampla gama de RYR1-RD, com a Miopatia Central Core (CCD) sendo a mais comum (n = 92/173, 53%). Suscetibilidade à Hipertermia Maligna (MHS) (n = 29/173,17%), Miopatia Centronuclear (CNM) (n = 10/173,6%), Desproporção Congênita do Tipo de Fibra (CFTD) (n = 9/173,5%) e Doença Multi-minicore (MmD) (n = 6/173,3%) foram outros diagnósticos, mas menos frequentes. 18 participantes indicaram "outro" para esta questão, com explicações de "incerto", "não especificado" ou "nova variante" (Fig. 2A). Nove pacientes tiveram um diagnóstico de MHS e miopatia. A herança foi autossômica dominante (AD) (n=61/215,28%), autossômica recessiva (AR) (n=59/215,27%), ou de novo ou espontânea (n=21/215,10%). Muitos dos participantes relataram não saber o modo de herança (n=74/215;34%) (Fig.2B).
Os participantes relataram sua capacidade física atual como capaz de andar sem assistência (n=145/223,65%), capaz de andar com assistência (n=27/223,12%), requer assistência de cadeira de rodas (n=13/223,6%) e requer uso de cadeira de rodas em tempo integral (n=38/223,17%). Pacientes com uma mutação ARordenovo necessitaram mais frequentemente do uso de cadeira de rodas em tempo integral (30,5% e 38% respectivamente, vs 5%, p < 0,001). Quase metade dos participantes considerou seus sintomas como progressivos (n = 107/223,47%), e um terço os relatou como estáveis (n = 77/223,34%). Outros não foram capazes de avaliar sua progressão devido a comorbidades ou sintomas variáveis.
Resultados dos depoimentos - Um total de 50 citações ilustraram o processo de diagnóstico (Tabela 3). Vários indivíduos mencionaram uma longa jornada de diagnóstico de meses a vários anos, chegando à idade adulta (início) quando foram diagnosticados, embora o início da doença tenha sido no nascimento. Alguns desses pacientes receberam um diagnóstico inicial incorreto, incluindo doença mitocondrial ou paralisia cerebral, antes que o diagnóstico correto de um RYR1-RD fosse finalmente estabelecido.
A vida antes do diagnóstico - Nas décadas de 1980 e 1990, pouca informação era conhecida sobre RYR1-RDs. O padrão de fraqueza, idade de início, sintomas específicos e a gravidade dos sintomas frequentemente resultavam em um amplo diagnóstico diferencial, e biópsias musculares eram frequentemente necessárias para confirmar o diagnóstico. Em geral, os pacientes comentaram sobre a dificuldade de ser diagnosticado com uma doença rara. Os pacientes ressaltaram o início precoce dos sintomas, incluindo atraso no desenvolvimento, mas também como esses primeiros sinais eram frequentemente ignorados ou reconhecidos somente após vários anos.
Diagnóstico - Em geral, os pacientes mencionaram seu histórico familiar de RYR1-RDs por meio de seus pais, irmãos ou outros membros da família, remontando a gerações. Eles relataram uma variabilidade intrafamiliar da gravidade da doença e a maneira como vivenciaram seu próprio diagnóstico ou o diagnóstico de seu filho. Um paciente mencionou que teve que esperar meses para consultar um especialista neuromuscular e, para alguns pacientes, levou anos para serem diagnosticados. Isso causou muito estresse para o paciente e sua família, principalmente por causa da incerteza associada. Pais sem formação médica enfrentaram desafios significativos para encontrar o caminho correto para o diagnóstico. Outros pais mencionaram que se sentiam solitários, pois não conheciam mais ninguém com uma experiência semelhante. Além disso, esses pais expressaram como a Fundação RYR-1 e a comunidade de pacientes os ajudaram. No geral, os pacientes descreveram seu processo de diagnóstico como uma longa jornada com muitas visitas ao hospital, testes adicionais e muitas perguntas sem resposta. Um dos pais mencionou o alívio que sentiu quando finalmente teve uma resposta para o diagnóstico de seu filho, embora não fosse o diagnóstico que esperavam ouvir. A maioria dos pais também expressou suas preocupações e estresse sobre a vida futura após o diagnóstico.
SINTOMAS E IMPACTO DA CONDIÇÃO
Resultados da pesquisa - Esta parte da pesquisa consistiu em três perguntas. A primeira pergunta sobre sintomas gerais propôs várias opções de resposta, incluindo, entre outras, fraqueza muscular geral, fadiga e dificuldades respiratórias, com uma opção aberta para listar outros sintomas. Os pacientes foram convidados a relatar todos os sintomas que se aplicavam a eles. Fraqueza muscular geral foi a mais frequentemente relatada (n = 190/227, 84%), seguida por fraqueza nas pernas (n = 185/227, 82%), dificuldade para correr (n = 183/227, 81%), dificuldade com escadas e para se levantar (n = 177/227, 78%) e fadiga (n = 168/227, 74%) (Fig. 3A e B). Para os sintomas acima mencionados, o grupo MHS teve uma frequência significativamente menor, exceto para fadiga, em comparação ao grupo miopatia. Não foram encontradas diferenças para esses sintomas entre diferentes faixas etárias (dados não mostrados). Também não houve correlação entre a idade do diagnóstico e o número de sintomas (r(210)=–0,79, p=0,253).
Os pacientes que necessitaram de uso integral de cadeira de rodas (n=38) ou caminharam com assistência (n=13) apresentaram significativamente mais sintomas do que aqueles capazes de caminhar sem assistência (n=145) (número médio de sintomas 13,5±3,3 e 11,6±3,8 vs. 9,12±4,2 respectivamente; p<0,001). Aqueles que necessitaram de uso integral de cadeira de rodas também relataram dificuldades respiratórias significativamente mais frequentes do que todos os outros grupos de mobilidade (0,76±0,43 vs. 0,26±0,44, 0,37±0,49 e 0,31±0,48; p<0,001). As dificuldades respiratórias não diferiram entre os diferentes tipos de RYR1-RD. A análise da diferença entre homens e mulheres resultou em um número total significativamente maior de sintomas para mulheres (10,8 ± 4,1 vs 9,2 ± 4,3; p = 0,004); em particular, as mulheres relataram fraqueza muscular generalizada com mais frequência (0,89 ± 0,32 vs 0,75 ± 0,44, p = 0,006). O modo de herança não teve influência na quantidade de sintomas. Ao correlacionar a fadiga com limitações na vida diária e fraqueza muscular, associações significativas foram encontradas para todos esses sintomas, exceto para dificuldades respiratórias e atrasos nos marcos motores, com dificuldades para correr e levantar tendo a maior correlação com a fadiga. No entanto, essas associações foram de ruins a razoáveis [10] (Tabela 4).
A segunda questão desta parte da pesquisa foi relacionada ao impacto do RYR1-RD no bem-estar geral. A questão "O RYR-1 afeta seu bem-estar em alguma das seguintes áreas" gerou as seguintes respostas: "fisicamente" (n = 202/227, 89%), "emocionalmente" (n = 145/227, 64%), "socialmente" (n = 132/227, 58%), financeiramente (n = 86/227, 38%), nutricionalmente (n = 60/227, 26%), educacionalmente (31/227, 12%) e espiritualmente (n = 18/227, 7%) (Fig. 3C). Além disso, os entrevistados foram solicitados a elaborar esta questão com comentários abertos (n = 168/227); exemplos de cada categoria destes são apresentados na Tabela 5.
Não foram encontradas diferenças entre os diferentes tipos de RYR1-RD (miopatia, MHS ou ambos) para os desafios não clínicos mais frequentemente mencionados (físicos, emocionais e sociais) ou o número total de desafios não clínicos. Ao diferenciar entre os diferentes estados de deambulação, os participantes que necessitam de uso de cadeira de rodas em tempo integral relataram manifestações sociais mais frequentemente e um maior número total de outros desafios não clínicos em comparação com aqueles capazes de andar sem ajuda (0,76 ± 0,43 vs 0,5 ± 0,50; p = 0,017 e 3,9 ± 1,7 vs 2,7 ± 1,6; p < 0,001, respectivamente). As mulheres relataram mais frequentemente seu bem-estar social como adversamente afetado em comparação aos pacientes do sexo masculino (0,64 ± 0,48 vs 0,48 ± 0,50; p = 0,018). Adultos indicaram com mais frequência que seu bem-estar emocional foi afetado negativamente em comparação com crianças (0,71±0,46 vs 0,48±0,50; p=0,001). Ao avaliar a correlação entre esses sintomas e fadiga, algumas associações significativas foram encontradas (Tabela 4) com apenas correlações fracas a razoáveis.
Resultados dos depoimentos - No total, 108 citações foram identificadas neste tema, com uma seleção de citações apresentadas na Tabela 6. Os sintomas mais comuns que surgiram os depoimentos dos pacientes foram físicos (em particular dor e fadiga) e sociais/emocionais, observando as barreiras físicas e mentais que o RYR1-RD introduziu em suas vidas. Muitos indivíduos indicaram um efeito benéfico da atividade regular e do exercício em seus sintomas, ao mesmo tempo em que expressaram preocupações e incertezas sobre quais tipos e frequência de atividades que podem ser mais benéficos, ao mesmo tempo em que tentam evitar dor excessiva e danos musculares. Vários indivíduos perguntaram sobre abordagens nutricionais que podem promover a saúde muscular. Outros compartilharam abordagens que eles experimentaram como benéficas, incluindo suplementação com creatina e magnésio.
Sintomas - Os sintomas de RYR1-RD se apresentaram em alguns pacientes no nascimento e se desenvolveram mais tarde na vida em outros. Os sintomas congênitos incluíam quadris deslocados, pernas fraturadas e dificuldades físicas. Além disso, alguns pacientes tinham má oclusão dentária grave, exigindo cirurgia de mandíbula. Outros pacientes passaram por uma série de aparelhos ortopédicos e operações para tratar escoliose. Além das limitações físicas, sintomas não neuromusculares como fraqueza respiratória e fadiga crônica também foram relatados. Dificuldades de mastigação e/ou deglutição contribuíram para a dificuldade em manter o peso. Ser incapaz de regular a temperatura corporal, sofrer de cãibras nas pernas ou sentir dormência nas pernas foram sintomas adicionais mencionados. Em alguns pacientes, esses sintomas continuaram a piorar ao longo do tempo.
Efeito no funcionamento físico - No geral, os pacientes apresentaram dificuldades físicas significativas. Isso foi expresso principalmente por meio do atraso na obtenção de marcos motores e fraqueza muscular. Por exemplo, ser capaz de andar independentemente era um desafio. À medida que os pacientes envelheciam, os desafios permaneceram para outras atividades físicas, como subir escadas e/ou correr. Outras dificuldades mencionadas incluíam sentar, levantar, curvar-se, amarrar cadarços, ficar de pé por alguns minutos e manter o equilíbrio. A gravidade no funcionamento físico variou entre os participantes. Muitos pacientes relataram não ter conseguido acompanhar seus colegas na infância ou na idade adulta. Alguns (avós) pais expressaram como gostariam de acompanhar seus (netos). A maioria dos participantes usou várias ferramentas para lidar com suas dificuldades físicas. Um dos pais fez um triciclo personalizado para seu filho. Além disso, os pacientes usaram muletas de antebraço, bengalas, cadeiras de rodas e elevadores de cadeira. Embora a grande maioria dos participantes tenha compartilhado suas experiências com incapacidades físicas, alguns participantes mencionaram que haviam alcançado a maioria dos marcos motores e ainda eram capazes de viver uma vida sem dificuldade ou muita adaptação.
Efeito na vida diária - Os participantes enfatizaram o efeito da condição em sua vida diária e como vários sintomas afetaram sua qualidade de vida. Por exemplo, alguns participantes expressaram como a fadiga e o medo de cair impactaram sua vida diária. Enquanto alguns participantes tinham energia suficiente apenas para o trabalho, outros tiveram que se aposentar mais cedo devido à sua condição. A fadiga e a dor também foram relatadas como barreiras à participação social, sendo uma razão para alguns participantes evitarem sair. Um paciente explicou como havia pequenas coisas que eles não conseguiam fazer e que provavelmente seriam consideradas certas por pessoas saudáveis/outros indivíduos. Por exemplo, ser capaz de caminhar certas distâncias, subir um degrau ou lance de escadas e levantar objetos mais pesados. Apesar de suas limitações, os pacientes queriam ser independentes, e as crianças queriam acompanhar seus colegas. A maioria dos pacientes mencionou como eles ainda podem funcionar de forma independente, apesar de sua doença, especialmente com algumas modificações, por exemplo, usando uma cadeira de rodas (motorizada). Simultaneamente, eles também expressaram como eles precisavam de assistência com cuidados e apoio de outras pessoas. Os pacientes explicaram como eles conseguiram ir para a faculdade, se formar, ter uma vida social, cuidar de si mesmos e se sentir realizados e orgulhosos. No entanto, os pacientes também reconheceram como sua condição, pelo menos, os definia em parte, impactando escolhas e como eles sentiam que eram vistos pelos outros. Com a idade, esses desafios se tornaram mais frequentes e impactantes. Para os pacientes, um tratamento eficaz permitiria uma melhora na vida diária e se tornar/permanecer independente.
Efeito na saúde mental - RYR1-RD impactou pacientes e familiares, passando por um longo processo de aceitação da condição. Os pais se sentiam solitários e isolados às vezes, por não conhecerem ninguém em uma posição semelhante. Alguns pacientes falaram sobre as dificuldades que enfrentaram durante a infância. Os pacientes se sentiam envergonhados, por exemplo, sobre suas cicatrizes, e um indivíduo mencionou ter sofrido bullying por causa de um suporte lombar. Em geral, eles achavam difícil fazer amigos. Os familiares sentiam episódios de culpa e também tinham dificuldades em processar a condição. No geral, os pacientes vivenciavam sentimentos de decepção, derrota e tristeza. A sensação de ser diferente causava sentimentos de solidão. Além disso, também foi mencionado como os pacientes se sentiam muito gratos pelo apoio que recebiam da família, amigos e profissionais de saúde. A disposição dos profissionais de saúde em tentar entender e ajudar os pacientes era apreciada. Alguns pacientes mencionaram como sua religião e o apoio da família e dos amigos os fortaleceram. Enquanto um participante explicou a dificuldade de pedir ajuda, outro participante mencionou como amigos e familiares eram um incentivo para participar de atividades e se tornarem independentes. Apesar das dificuldades e impossibilidades vivenciadas pelos pacientes, também foi mencionado como alguns indivíduos tentaram se concentrar em todas as possibilidades que tinham. No entanto, houve uma necessidade de apoio profissional para a saúde mental expressa por pacientes e familiares.
ATIVIDADE FÍSICA
Resultados da pesquisa - Esta parte consistiu em quatro perguntas sobre o número e o tipo de atividade física e a preservação ou melhora da força experimentada. Os participantes relataram a frequência da atividade física como 1-2 vezes por semana (n=66, 29%), 3-4 vezes por semana (n=64, 28%), 5-6 vezes por semana (n=38, 17%) e pelo menos diariamente (n=23, 10%). Apenas 32 pacientes (14%) não participaram de atividade física ou exercício algum. A frequência da atividade física não diferiu entre os diferentes tipos de RYR1-RD. Para os participantes que necessitaram de assistência de cadeira de rodas, uma correlação moderadamente negativa foi encontrada entre a quantidade de exercício e a fadiga (r(12) =–0,622, p=0,023).
Uma ampla gama de atividades físicas específicas foi relatada por 193 pacientes, incluindo caminhada (n = 130/193, 67%), fisioterapia (n = 63/193, 33%), natação (n = 53/193, 27%), treinamento de peso e resistência (n = 39/193, 20%) e ciclismo (n = 33/193, 17%). A maioria dos pacientes relatou ser capaz de manter ou melhorar sua força e/ou resistência (n = 94/197, 48%), enquanto 52 pacientes (26%) não apresentaram melhora. Os outros participantes (n = 51/197, 26%) indicaram que não tinham certeza. Os motivos para não participar de esportes foram "Não consigo criar uma rotina de exercícios que funcione para mim" (23/40, 58%); ‘Estou preocupado com a minha segurança’ (n = 10/40, 25%); ‘Não acredito que o exercício físico irá manter ou melhorar a minha condição’ (n = 9/40, 23%); e ‘Não tenho tempo’ (n = 3/40, 8%).
TRATAMENTO
Resultados dos depoimentos - No total, 20 citações sobre tratamentos anteriores e em andamento foram identificadas. Uma seleção de citações é apresentada na Tabela 7.
Atualmente, não há tratamento definitivo disponível para RYR1-RD. No entanto, várias terapias estavam sendo usadas para ajudar a aliviar os sintomas. Além disso, um quarto dos pacientes relatou como otimizaram sua nutrição e suplementação, por exemplo, tomando creatina em pó para promover massa muscular, bem como várias vitaminas. Um paciente do MHS explicou como eles usaram dantrolene em baixa dosagem e como isso levou a uma qualidade de vida aceitável. Outro paciente usou ventilação não invasiva, permitindo um ganho de energia e um humor geral melhor. A maioria dos pacientes havia iniciado algum tipo de fisioterapia. Em alguns casos, isso foi combinado com terapia ocupacional e terapia da fala. Um paciente mencionou o uso de diferentes tipos de tratamento, como terapia de calor, massagem, ventosaterapia, mas também analgésicos para reduzir dores musculares e espasmos nas costas. Vários pacientes tiveram a oportunidade de participar de um ensaio clínico de medicamentos, com uma experiência geral positiva. Em geral, os participantes descreveram que, embora não se esperasse que o medicamento do estudo curasse a doença, ele tinha sido a única opção para potencialmente melhorar sua QV. Além disso, outro motivador para participar de um ensaio clínico ou tentar vários tipos de suplementos era encontrar um tratamento eficaz para os outros, especialmente para os pais e seus próprios filhos.
PESQUISA E ESTUDOS CLÍNICOS
Resultados da pesquisa - A parte final da pesquisa (cinco perguntas) abordou se os participantes participariam de ensaios clínicos e o que eles achavam que os pesquisadores precisavam saber sobre viver com um RYR1-RD. A questão se os participantes estariam dispostos a participar de um ensaio clínico foi amplamente respondida positivamente ('definitivamente participar' (n = 90/226, 40%), 'provavelmente participará' (n = 102/226, 45%), 'improvável participar' (n = 22/226, 10%) 'não participará' (n = 10/226, 4%). Os participantes que responderam negativamente o fizeram principalmente por preocupações com o impacto na rotina diária (n = 19/32,59%), preocupações com sua segurança (n = 16/32, 50%) e falta de crença em um tratamento ou cura (n = 2/32, 6%).
Com 154 pacientes respondendo a 'o que os pesquisadores precisam saber ou entender melhor sobre viver com RYR-1?', a maioria declarou muitas questões além das preocupações estritamente médicas (incluindo dor) que os pacientes enfrentam frequentemente em sua vida diária. Além disso, os participantes indicaram certas modificações nutricionais e medicamentos que achavam que poderiam ajudar com seus sintomas. Uma seleção dos As respostas a esta questão aberta são apresentadas na Tabela 8. Finalmente, as perguntas dos participantes para a comunidade médica se concentraram principalmente na melhoria do bem-estar físico e emocional (n = 167/210, 80%), no alívio dos sintomas diários (n = 107/210, 51%) e no impacto dos fatores ambientais (n = 129/210, 61%).
EXPECTATIVAS
Resultados dos depoimentos - Identificamos 38 citações sobre expectativas do curso natural da doença e desenvolvimentos em pesquisa. Uma seleção de citações é apresentada na Tabela 9.
Expectativas - Os participantes compartilharam seus pensamentos e expectativas em relação aos tratamentos futuros. Em geral, os participantes esperam um tratamento eficaz, pelo menos retardando a progressão de sua doença. Alguns participantes expressaram o desejo de recuperar a força, a resistência e a possibilidade de poder realizar atividades como correr, subir escadas ou levantar objetos. Outros participantes enfatizaram a motivação de ajudar outros pacientes e famílias, por exemplo, por meio da participação em ensaios clínicos para avançar ainda mais o conhecimento da doença e, ao mesmo tempo, retribuir algo à comunidade científica. Um participante mencionou o desejo de defender os outros e poder entrar em contato com esses pacientes. Vários participantes expressaram a necessidade de uma cura para si próprios e futuros pacientes para tratar sintomas como cãibras musculares, fadiga e oftalmoparesia. A expectativa de declínio da função ao longo do tempo foi percebida como preocupante. Enquanto um participante elaborou sobre a progressão da doença vivenciada, outro participante mencionou o medo de ser pai ou mãe de uma criança afetada e os possíveis desafios para o futuro.
Obtendo conhecimento - Os participantes enfatizaram a importância de obter conhecimento sobre a condição e possíveis tratamentos. A maioria dos participantes conduziu sua própria busca por informações, principalmente por curiosidade, mas também devido à falta de informações suficientes fornecidas por seus provedores de saúde. Além disso, um participante mencionou a importância de informações abrangentes, especialmente para pessoas com formação não científica e devido à grande quantidade de informações disponíveis. A maioria dos participantes expressou o quanto o diagnóstico significou para eles, mesmo com a ausência de cura. Simultaneamente, os participantes também elaboraram sobre o acesso ao suporte. Uma compreensão da doença e saber que a pesquisa está sendo conduzida foi considerada impactante. Poder conhecer pessoas com um diagnóstico semelhante e desafios semelhantes também foi útil. Os participantes tiveram contato com outras pessoas por meio de mídia social, e-mail e videochamadas. Era importante que os pacientes e familiares conhecessem seus pares e pudessem se relacionar com outras pessoas. O papel crucial da organização de pacientes também foi mencionado aqui, principalmente ao fornecer acesso à informação, abordar os desafios e conectar as pessoas. Por fim, muitas pessoas expressaram sua sincera gratidão pelo trabalho dos clínicos e pesquisadores da área, ao mesmo tempo em que os encorajaram a continuar progredindo no desenvolvimento da terapia.
DISCUSSÃO
Por meio da pesquisa realizada neste estudo, coletamos opiniões de pacientes com uma ampla gama de RYR1-RD (n = 227). Os resultados mostram que indivíduos de todas as idades são afetados por RYR1-RD e que a idade no diagnóstico varia amplamente. Pacientes com miopatia foram diagnosticados mais cedo do que aqueles com MHS (mediana de 18,5 e 29,0, respectivamente). A maioria dos pacientes, tanto com miopatia quanto com MHS, era ambulatória e aproximadamente metade dos participantes considerou sua doença progressiva. Com base nos resultados da pesquisa e 12 depoimentos, os pacientes relataram um grande impacto do RYR1-RD em suas vidas. A maioria dos entrevistados relatou estar envolvida em atividade física regular ou exercício, metade dos quais experimentou melhora de força e/ou resistência. Finalmente, a maioria dos pacientes estava disposta a considerar a participação em futuros ensaios clínicos.
Ao refletir sobre essas descobertas, notamos que os tipos relatados de RYR1-RD são semelhantes aos relatados em publicações anteriores na área, com CCD e MHS sendo os mais prevalentes [1,2]. No entanto, este estudo fornece a perspectiva mais abrangente do paciente até o momento sobre o amplo impacto da RYR1-RD na vida cotidiana, fornecendo insights únicos e importantes para consideração futura. Os participantes relataram múltiplos domínios da vida diária influenciados por sua doença: físico, social, emocional e, com menos frequência, financeiro, nutricional e espiritual. Apenas 8% dos participantes relataram que a RYR1-RD não impactou seu bem-estar geral. Essas descobertas estão de acordo com um estudo recente sobre a qualidade de vida relacionada à saúde em indivíduos afetados com RYR1-RD [11]. Os domínios mais valiosos revelados pelas análises qualitativas deste estudo foram a importância dos impactos sociais, o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento, tanto físicas quanto psicológicas, e a identificação de fadiga e fraqueza como sintomas principais.
Os achados apoiam observações anteriores de um estudo de questionário em pacientes holandeses com RYR1-RD, demonstrando comprometimentos funcionais substanciais e fadiga crônica em comparação com controles saudáveis [3]. Como esperado, descobrimos que fadiga, dor e dificuldades físicas e sociais associadas foram mais pronunciadas em indivíduos com miopatias congênitas relacionadas ao RYR1 em comparação com indivíduos com MHS. O bem-estar emocional foi mais impactado em adultos do que em crianças. As crianças geralmente foram diagnosticadas em uma idade mais precoce, provavelmente devido ao recente aumento do conhecimento científico e médico sobre RYR1RD. A maioria dos adultos se lembra de saber apenas que algo estava errado quando eram jovens, mas não o que era e como lidar com isso. Para a maioria dos pacientes adultos, seu diagnóstico foi uma longa jornada tortuosa que levou muitos anos e também impactou significativamente outros membros da família.
Além disso, nossos resultados mostraram uma baixa correlação entre fadiga e vários outros sintomas, como fraqueza muscular. No entanto, a fadiga resultou em uma carga significativa em suas vidas diárias. A fadiga é influenciada por vários fatores, direta ou indiretamente [12]. Portanto, as correlações separadas podem ser baixas, mas o impacto na fadiga alto. Concluímos que casos relativamente leves do espectro clínico RYR1-RD estão, no entanto, associados a fadiga grave e limitações funcionais, resultando em perda substancial de qualidade de vida [3]. Por exemplo, a carga diária experimentada por indivíduos com MHS foi confirmada em nosso recente estudo transversal, mostrando uma alta prevalência de sintomas neuromusculares, como mialgia, cãibras musculares e fadiga, resultando em consultas médicas frequentes para identificar a causa desses sintomas [13]. Consistente com isso, a combinação de sintomas neuromusculares e não neuromusculares ocasionalmente piorando ao longo do tempo foi descrita nos depoimentos de alguns pacientes.
Pacientes com RYR1-RD relataram ser fisicamente ativos, frequentemente praticando caminhada, ciclismo, fisioterapia e natação ou hidroginástica, sem diferença na frequência de treinamento entre indivíduos com diferentes tipos de RYR1-RD. Notavelmente, treinamento com pesos ou resistência também foi relatado por 17% de todos os pacientes, atividades geralmente não recomendadas para indivíduos com miopatias [14–16]. Uma ampla gama de outras atividades físicas e esportes foram relatados, incluindo passeios a cavalo, ioga e pilates. Dificuldades em encontrar uma forma adequada de exercício ou preocupações com a segurança foram relatadas como barreiras específicas à participação em atividades físicas. Assim, a orientação sobre formas recomendadas de exercício, fisioterapia e treinamento poderia ser adicionada às diretrizes de cuidados clínicos recentemente desenvolvidas pela RYR-1 Foundation [17]. Descobriu-se que os pacientes faziam uso de várias ferramentas para lidar com suas lutas físicas. A função física diferiu entre os pacientes, e alguns expressaram como sentiam que ainda poderiam viver uma vida sem dificuldade ou muita adaptação. No entanto, a perda de força e resistência ao longo do tempo pode ser uma barreira significativa para vários tipos de atividades. Os pacientes estavam cientes do impacto emocional de sua doença e, portanto, precisam de recursos para ajudá-los a lidar com esses sentimentos, algo especialmente vivenciado pelos pais. Uma mistura semelhante de respostas emocionais também foi relatada nos depoimentos. Embora alguns pacientes tenham mencionado aspectos emocionais desafiadores associados à vida com um RYR1RD, o apoio da família, amigos e profissionais de saúde os ajudou a lidar com esses sentimentos.
Finalmente, este estudo também ofereceu uma perspectiva muito útil e única do paciente sobre futuros ensaios clínicos. A maioria dos participantes indicou que eles estavam (provavelmente) dispostos a participar, com as principais barreiras à participação sendo o impacto antecipado nas atividades da vida diária e preocupações com a segurança. Esta informação é importante, pois a perspectiva do paciente e a consideração de potenciais barreiras à participação são altamente relevantes para o desenho de ensaios clínicos e estão sendo cada vez mais consideradas. Embora as perspectivas já tenham sido fornecidas por grupos de defesa do paciente para atrofia muscular espinhal [5, 18], esta contribuição valiosa ainda está faltando para muitas outras condições neuromusculares. Alguns participantes também relataram suas experiências relacionadas a ensaios clínicos em andamento ou concluídos. Pesquisas futuras devem se concentrar na perspectiva do paciente em relação às expectativas terapêuticas e ao desenho de ensaios clínicos, o que pode melhorar significativamente o recrutamento, a retenção e os resultados do estudo [5].
Este estudo tem várias limitações. Primeiro, como a participação na pesquisa foi anônima, o diagnóstico foi relatado pelos pacientes e não pôde ser verificado de forma independente pelos clínicos que os diagnosticaram. Esta foi uma escolha deliberada dos pacientes que iniciaram esta pesquisa para reduzir o viés de averiguação, não limitando a participação a indivíduos com contato recente com profissionais de assistência médica. Segundo, o desenho do estudo inclui um viés de averiguação para indivíduos com acesso à internet e que foram informados sobre a RYR-1 Foundation e suas atividades. Terceiro, a pesquisa consistiu apenas em perguntas personalizadas. Os pesquisadores consideraram adicionar questionários validados sobre habilidades funcionais ou fadiga, mas deliberadamente escolheram não fazê-lo e se concentrar nas questões levantadas pela comunidade de pacientes. Sendo um questionário não validado, as formulações de certas perguntas podem ter levado a diferentes interpretações, possivelmente impactando os resultados. Por exemplo, esperava-se que as dificuldades respiratórias fossem mais frequentes para pacientes com miopatia congênita em comparação com MHS. No entanto, isso não foi encontrado nos resultados da pesquisa, o que pode refletir diferentes interpretações dos participantes sobre o que constitui dificuldades respiratórias. Se uma pergunta sobre o bem-estar dos participantes não revelar um problema específico, isso não significa necessariamente que o aspecto específico do bem-estar não seja diferente em comparação com indivíduos sem miopatia subjacente ou RYR1-RD. Por exemplo, se os participantes fizessem alterações em seu programa escolar, seu bem-estar educacional poderia ser como o de indivíduos sem miopatia subjacente ou RYR1-RD porque eles podem ir à escola como acharem adequado. No entanto, as perguntas usadas nesta pesquisa fornecem uma ideia geral de como os participantes são impactados por sua doença. Finalmente, a pesquisa estava disponível apenas em inglês, o que pode ter resultado em uma população de estudo que não é globalmente representativa.
Um ponto forte importante deste estudo é que a pesquisa foi realizada como um esforço colaborativo entre a comunidade de pacientes, uma organização de defesa de pacientes (RYR-1 Foundation) e clínicos-pesquisadores. As questões abordadas são tópicos importantes para a comunidade de pacientes. O design e a execução da pesquisa, bem como a apresentação dos resultados da pesquisa e depoimentos dos pacientes durante o workshop, foram apoiados e facilitados pela RYR-1 Foundation e os resultados foram avaliados quantitativa e qualitativamente em consulta com pesquisadores acadêmicos. No entanto, este estudo foi conduzido principalmente por pacientes e famílias do RYR1-RD, o que resultou em uma participação robusta, um aspecto cuja importância é cada vez mais reconhecida pelas autoridades regulatórias e de reembolso.
Concluindo, este estudo fornece uma perspectiva única do paciente sobre a jornada diagnóstica, o impacto da doença, os desafios psicossociais, as atividades físicas, bem como as expectativas do paciente para tratamentos futuros e ensaios clínicos de indivíduos com RYR1-RD.
AGRADECIMENTOS
Os autores gostariam de agradecer à equipe do RYR-1 Foundation Study que projetou e executou o estudo e a todos os participantes deste estudo pelo tempo dedicado a concluir a pesquisa e por compartilhar seus depoimentos. Vários autores desta publicação são membros do Netherlands Neuromuscular Center (NL-NMD) e da European Reference Network for rare neuromuscular diseases (EURO-NMD).
FINANCIAMENTO
Este trabalho foi apoiado financeiramente pelo Princes Beatrix Fund (número de concessão W.OR22-10) e pelos Institutos Nacionais de Saúde (número de concessão AR078000).
CONFLITO DE INTERESSE
Heinz Jungbluth é um membro do Conselho Editorial deste periódico, mas não esteve envolvido no processo de revisão por pares nem teve acesso a nenhuma informação sobre sua revisão por pares. Os outros autores não relatam mais conflitos de interesse.
DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS
Devido à natureza desta pesquisa, os participantes deste estudo não concordaram que seus dados fossem compartilhados publicamente, portanto, dados de apoio não estão disponíveis.
MATERIAIS SUPLEMENTARES
O material suplementar está disponível na versão eletrônica deste artigo: https://dx.doi.org/ 10.3233/JND-240029.
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Buscando estar sempre conectado com as notícias relacionadas e de interesse dos portadores de mutação no gene RYR1, mais especificamente a Miopatia Congênita Centronuclear, que se trata da doença que me acomete, tomei conhecimento da recente pré-publicação científica, intitulada, “O Propofol liga-se diretamente e inibe o receptor 1 de rianodina do músculo esquelético (RYR1)”, versão postada em 12 de janeiro de 2024, na qual os pesquisadores, Thomas T. Joseph, MD, PhD¹, Weiming Bu, PhD¹, Omid Haji-Ghassemi, PhD², Yu Seby Chen, PhD², Kellie Woll, PhD², Paul D. Allen, MD, PhD⁴, Grace Brannigan, PhD³, Filip Van Petegem, PhD², Roderic G. Eckenhoff, MD¹, através de resultados obtidos em estudos e ensaios sugerem em seus relatos que o propofol, um agente anestésico intravenoso de curta ação, em concentrações clínicas, se liga ao receptor de rianodina tipo 1 (RYR1), inibindo sua abertura, podendo assim, prevenir as manifestações clínicas da Hipertermia Maligna (HM), mesmo com exposição a agentes desencadeantes como os anestésicos voláteis.
Confira a integra da publicação pelo seguinte link: https://www.biorxiv.org/content/10.1101/2024.01.10.575040v1.full
O receptor de rianodina tipo 1 (RYR1) desempenha um papel central na determinação de quando (tempo), e quanta (quantidade) força é produzida pelos músculos esqueléticos, que é necessária e essencial para movimentação do corpo e atividades físicas diárias dos indivíduos. Como principal canal de liberação de íon de cálcio (Ca²⁺) no retículo sarcoplasmático do músculo esquelético, a mutação genética no receptor de rianodina tipo 1 (RYR1), tem a ela subjacentes, algumas doenças ou distúrbios musculares, tais como a Miopatia Centronuclear, Miopatia Central Core, Miopatia Multi-Minicore, Desproporção Congênita do Tipo de Fibra, incluindo distúrbios como a Rabdomiólise por Esforço, e a Hipertermia Maligna (HM).
Em pacientes com a mutação no gene RYR1, “a crise” de Hipertermia Maligna, causada pela exposição a algumas drogas desencadeantes, como os anestésicos voláteis halogenados, pode direcionar o RYR1 a deixar o canal de rianodina em um estado aberto, resultando em uma liberação descontrolada de Ca²⁺, acarretando em tensão no sarcômero, e consequente produção de calor. A restauração de Ca²⁺ no retículo sarcoplasmático também consome ATP (adenosina trifosfato), molécula responsável pelo depósito de energia celular, gerando também por consequência uma carga metabólica adicional insustentável.
Ao anestesiar pacientes com mutações genéticas conhecidas pela suscetibilidade a Hipertermia Maligna, o anestésico geral intravenoso não desencadeante propofol é comumente substituído por anestésicos desencadeantes. As evidências de ligação direta de agentes anestésicos ao RYR1 ou seus parceiros de ligação são escassas, e as interações em nível atômico do propofol com o RYR1 são totalmente desconhecidas. Os pesquisadores mostram no trabalho acima descrito que o propofol diminui a abertura do receptor do canal de rianodina (RYR1) com vesículas no retículo sarcoplasmático e bicamadas lipídicas planas, e que inibe a liberação de Ca²⁺ induzida por ativador do retículo sarcoplasmático no músculo esquelético humano. Além de confirmar a ligação direta, a marcação por fotoafinidade usando m-azipropofol (AziPm) revelou vários supostos locais de ligação de propofol no RYR1. A projeção pela simulação dinâmica da afinidade de ligação molecular sugere que o propofol se liga a pelo menos um destes locais em concentrações clínicas. Esses achados convidam à hipótese de que, além de o propofol não desencadear a Hipertermia Maligna, ele também pode ser protetor contra a Hipertermia Maligna, inibindo o fluxo induzido de Ca²⁺ através do canal de rianodina - RYR1.
¹ Department of Anesthesiology and Critical Care, Perelman School of Medicine, University of Pennsylvania, Philadelphia, PA USA; ² Department of Biochemistry, University of British Columbia, Vancouver, BC, Canada; ³ Department of Physics and Center for Computational and Integrative Biology, Rutgers University, Camden, NJ USA; ⁴ Department of Anesthesiology, University of Tennesee, Knoxville, TN USA
O artigo acima mencionado foi publicado na bioRxiv, repositório aberto de pré-publicação direcionado as ciências biológicas (https://www.biorxiv.org/), e hospedado pelo Cold Spring Harbor Laboratory (CSHL).
As doenças relacionadas ao RYR1 são identificadas com base em sua classificação histopatológica, isto é, pela aparência da biópsia do músculo na lâmina do microscópio. A diferenciação encontrada na biópsia designará o tipo da doença, se é por exemplo, Miopatia Central Core, Miopatia Multiminicore, Miopatia Centronuclear, ou Desproporção Congênita de Tipos de Fibras.
A Miopatia Congênita Centronuclear (MCCN) e a Miopatia Central Core (MCC) são ambas doenças musculares hereditárias causadas por mutações genéticas. A MCCN pode estar associada a mutações em diferentes genes, no DNM2, BIN1, MTM1, e RYR1, já a MCC está associada somente ao gene RYR1.
Esses tipos de doenças relacionadas ao RYR1 variam amplamente em termos dos seus diferentes sinais e sintomas, de quando eles inicialmente se apresentaram, além da sua respectiva gravidade. Embora sejam altamente variáveis, os sintomas presentes também dependem se a mutação do gene RYR1 é autossômica dominante ou autossômica recessiva.
Uma pergunta que sempre chega até mim é sobre as diferenças entre a Miopatia Centronuclear e a Miopatia Central Core. Assim, eu, enquanto portador da Miopatia Congênita Centronuclear (MCN), buscarei esclarecer pontualmente neste texto, me atendo ao tipo que me acomete, que é a pela mutação no gene RYR1.
Estas doenças apesar de terem sintomas parecidos e compartilharem de algumas características clínicas em comum, se confundem entre si, e apresentam com algumas diferenças distintas:
Miopatia Congênita Centronuclear (MCCN)
Miopatia Central Core (MCC)
Em resumo, a Miopatia Congênita Centronuclear e a Miopatia Central Core, ambas doenças relacionada ao RYR1, têm seus sintomas e sinais físicos que podem se parecer, podem se confundir, mas são diferentes, a contar da análise histológica das células musculares em uma biópsia, exame este que é crucial para diferenciar entre as duas condições e determinar o diagnóstico correto, conduta médica, tratamento, e até prognóstico de evolução.
Nota: todo o material escrito nesta página é oriundo de pesquisa científica, e conclusões próprias do autor deste website, que convive como portador, desde o nascimento, com a Miopatia Congênita Centronuclear causada pela mutação no gene RYR-1
ARMGO PHARMA PÚBLICA IMPORTANTES E POSITIVOS RESULTADOS DO ENSAIO DE FASE 1B DO RYCALl® ARM210 PARA O TRATAMENTO DE MIOPATIAS RELACIONADAS AO RECEPTOR DE RIANODINA 1
ARMGO Pharma, Inc. (ARMGO), uma empresa privada no setor biofarmacêutico que desenvolve uma nova classe de drogas de moléculas pequenas ou micro moléculas conhecidas como Rycals®, anunciou em 29 de janeiro de 2024 a publicação dos resultados de um estudo de Fase 1b de seu Rycal ARM210 (também conhecido como S48168), para o tratamento de miopatias relacionadas ao receptor 1 de Ryanodina (RYR1-RM), uma doença muscular órfã, também chamada de “doença rara”, por ser uma doença que afeta uma pequena percentagem da população.
Os dados foram publicados em um artigo intitulado 'Rycal S48168 (ARM210) para Miopatias Relacionadas ao RYR1: um ensaio de fase um, estudo em aberto, e de ensaio de escalonamento de dose', de autoria do Dr. Joshua Todd et al, no Journal eClinicalMedicine, parte da família de publicações Lancet. O artigo revisa os dados do estudo de Fase 1b do ARM210 e seu novo mecanismo de ação alostérico (MoA) visando a causa raiz da doença relacionada ao RYR-1 (RYR1-RM): mutação do Receptor 1 de Ryanodina (RYR1).
O gene RYR1 que codifica o Receptor 1 de Ryanodina RYR1, um canal intracelular de liberação de cálcio, vaza em doenças musculares. Vazamentos intracelulares de cálcio causados por canais RYR1 com mutação prejudicam a contração muscular, levando à fraqueza muscular e perda de função, e ativam vias tóxicas que danificam os músculos, causando os sintomas das doenças relacionadas ao RYR1.
O ensaio de Fase 1b, aberto, de escalonamento de dose confirmou a segurança, tolerabilidade e farmacocinética da dosagem de 120 e 200 mg de ARM210 diariamente durante 29 dias em homens e mulheres adultos afetados pelas doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RM).
É importante ressaltar que o estudo também demonstrou eficácia preliminar no grupo de dose mais alta em dois sintomas característicos das doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RM): 1) alívio significativo da fadiga avaliada pelo sistema PROMIS-fatigue (Patient-Reported-Outcome Measurement Information System) t-scores, e 2) melhora da força dos proximais avaliada pelo exame físico de abdução do ombro (Medical Research Council Grading). Estes resultados justificam o desenvolvimento futuro do ARM210 como um potencial tratamento e modificador da doença para as miopatias relacionadas ao RYR1 (RYR1-RM) em um ensaio de Fase 2 randomizado e controlado por placebo.
O ensaio de Fase 1b concluído foi conduzido em colaboração com o National Institute of Neurological Disorders and Stroke (NINDS) e National Institute of Health (NIH) sob um Acordo Cooperativo de Pesquisa e Desenvolvimento (CRADA - Cooperative Research and Development Agreement ), com o apoio da Fundação RYR-1, Pittsburgh, PA, EUA.
“Estamos muito satisfeitos com os resultados do ensaio com as doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RM) conduzido em conjunto com o NIH, pois o estudo confirmou a segurança e tolerabilidade do ARM210, mas o mais importante, demonstrou pela primeira vez que o nosso Rycal®, ARM210, pode reverter os sintomas desta doença muscular crônica e devastadora em um curto período de tratamento. Isso é muito promissor”, disse Gene Marcantonio, M.D., Ph.D., CEO da ARMGO Pharma. “Esperamos, portanto, continuar rapidamente no desenvolvimento do ARM210 para levar este primeiro e potencial tratamento aos pacientes com as doenças relacionadas ao RYR1, com o apoio da Fundação RYR-1 e da comunidade de pacientes.”
Michael F. Goldberg, MD, MPH, co-presidente de pesquisa da Fundação RYR-1 acrescentou: “Estamos entusiasmados com a publicação deste importante estudo, pois representa um farol de esperança para muitos indivíduos e famílias de todo o mundo afetados pelas doenças relacionadas ao RYR1. Estamos ansiosos pelas próximas etapas de ensaios no desenvolvimento dessa importante droga.”
Mais informações sobre este estudo de Fase 1b podem ser encontradas online em: https://clinicaltrials.gov/study/NCT04141670. O ensaio foi apoiado pelos Programas de Pesquisa Intramural do NIH/NINDS, NIH/NINR, um NIH Clinical Center Bench to Bedside Award (2017-551673) e pelo parceiro de colaboração anterior da ARMGO, Les Laboratoires Servier. O conteúdo é de responsabilidade exclusiva dos autores e não representa necessariamente a opinião oficial dos Institutos Nacionais de Saúde.
BREVE REVISÃO SOBRE A FUNÇÃO DO RYR1 E DOENÇAS RELACIONADAS
Os RYRs são canais homotetraméricos de liberação de cálcio intracelular responsáveis pelo fluxo de Ca2+ dos retículos sarcoplasmáticos/endoplasmáticos (RS/RE) para o citoplasma da maioria dos tipos de células. RYR1 é a isoforma predominante no músculo esquelético de mamíferos, onde a liberação de Ca2+ via RYR1 é necessária para o acoplamento excitação-contração e função muscular normal. Já o RYR2 é a isoforma predominante no músculo cardíaco onde a liberação de Ca2+ via RYR2 é necessária para a função normal do músculo cardíaco. Mutações genéticas humanas nos genes RYR1 e RYR2 fazem com que o cálcio vaze dos canais RYR, levando à doença (Figura 1).
Os canais RYR normalmente alternam entre um estado de repouso (fechado) e excitado (aberto). Em certas doenças, em que existe a mutação genética, o RYR é modificado e torna-se incontinente ou seja, fica vazando. No caso do RYR1, este desempenha um papel crítico no músculo esquelético, e as mutações do RYR1 em humanos levam a uma miopatia progressiva, conhecida como doenças relacionadas ao RYR1 (RYR1-RM), privando o músculo da capacidade de responder eficazmente aos sinais de contração, levando à fraqueza muscular.
Sobre o Rycals® - A inibição do canal interromperia o vazamento, mas esta intervenção geralmente não seria benéfica, uma vez que bloquearia a função normal do RYR. O Rycals®, são moléculas que podem restaurar a função normal do canal sem bloquear o RYR, e abrem a possibilidade de intervenções terapêuticas.
Figura 1: Modelo da função do RYR. O RYR controla o fluxo de cálcio (Ca2+) de dentro do retículo sarcoplasmático (RS) através da membrana até o citoplasma. (Quadro Esquerdo) O RYR normal regula o fluxo de cálcio alternando entre um estado fechado e aberto. (Quadro Meio) Na RYR1-RM, o RYR mutado apresenta vazamento, levando ao fluxo anormal de cálcio, resultando em sintomas da doença. Modificações pós-traducionais* (MPTs) do RYR agravam ainda mais o vazamento. Em outros distúrbios musculares, como DMD, insuficiência cardíaca ou sarcopenia, as modificações pós-traducionais (MPTs) do RYR podem causar vazamento no canal, levando a um fluxo anormal de cálcio, resultando em sintomas da doença. (Quadro Direito) Rycals® liga-se aos canais incontinentes (com vazamento) e repara o vazamento independentemente da causa do vazamento, restaurando a função normal do canal. O Rycals® não bloqueia o RYR.
*As modificações pós-traducionais (MPTs) são modificações químicas e estruturais de uma cadeia proteica após a sua tradução. Estas modificações podem determinar a atividade, a localização e interações com outras proteínas.
Me chamo Lise, e sou mãe de um menino de 10 anos, João Miguel, diagnosticado com a Mutação do Gene Ryrr.1 Central Core. Moramos na cidade de Criciúma no Estado de Santa Catarina, Brasil. Eu e meu esposo esperamos o João por sete anos, e seu nascimento trouxe alegria a nossa casa.
O João nasceu com um pezinho torto congênito, e nos seus primeiros dias de vida passou a usar gesso até os 11 meses de idade, como também foram feitas duas cirurgias para concluir a correção do pé. O João começou a engatinhar com um ano e três meses e caminhar com um ano e nove meses, achávamos que esse atraso motor era pelo tempo que ele passou em recuperação do pezinho.
Aos três anos percebemos as quedas constantes e levamos esta nossa preocupação ao ortopedista que o acompanhava desde bebê. Após analise clinica o Dr percebeu a fraqueza muscular e que o João realizava a manobra de Gowers ao levantar-se. Saímos do consultório com encaminhamento para o Neurologista e ali iniciava-se anos de buscas e angustias por um diagnóstico. Foi realizado a eletromiografia onde constatou-se a fraqueza muscular, e vários exames. Mesmo o CPK com resultado normal, os médicos procuravam as doenças degenerativas mais graves, como Duchenne e Becker.
Aos cinco anos foi feito o exame do Painel Genético para as setenta doenças degenerativas musculares e veio o resultado negativo para todas elas. Foi um misto de alegria e angustia, pois não tínhamos fechado o diagnóstico. Aos três anos iniciamos os tratamentos recomendado pelo médico, com fisioterapias, equoterapia e natação. O desenvolvimento após inicio do tratamento foram visíveis, o João passou a ter mais equilíbrio, as quedas diminuíram, começou a subir escadas com apoio e ter mais firmeza para desce-las, a cada dia percebemos o progresso (lento), mais sempre constante na sua condição física.
Este ano (2023), após 7 anos de busca, conseguimos fechar o diagnóstico do João com o Exoma. Com o diagnostico a fisioterapeuta que o acompanha desde o inicio da nossa jornada montou um novo cronograma de exercícios, e adotamos que a “Vida é Movimento” então vamos nos movimentar e continuar escrevendo uma história linda para nosso menino que é cheio de vida e alegria!
O exame clínico é a técnica médica mais antiga utilizada na obtenção de informações gerais. Ele leva à compreensão sobre a situação do paciente atendido e assim pode-se diagnosticar e direcionar o melhor tratamento.
Na neurologia, atualmente, por mais que tenhamos disponíveis modernos meios de diagnóstico, o exame clínico, incluindo histórico de saúde e sinais físicos, ainda se faz como uma importante ferramenta aos médicos no diagnóstico de distúrbios neurológicos.
Trazendo esse tema para minha realidade, lembro-me de um fato que vivenciei em meados dos anos 60 que marcou muito a minha memória. Acredito ter sido de fundamental importância para o início do processo de investigação diagnóstica da minha patologia, por mais que a palavra conclusiva, de que era portador de Miopatia Congênita Centronuclear, só tenha sido dita 40 anos mais tarde.
Naquela época, com 5 anos de idade, meus pais já haviam peregrinando por vários médicos em busca de diagnóstico. Viviam com questionamentos e dúvidas quanto a minha situação física apresentada desde meu nascimento. Resolveram, então, me levar à consulta com um importante neurologista do Brasil.
Os recursos para diagnóstico disponíveis na época, assim como o conhecimento médico acerca de algumas doenças, eram bem limitados. Contudo, o exame clínico era um procedimento de que os médicos podiam se valer.
Quando disse que aquela consulta ficou marcada na minha memória, lembro que foi tudo meio traumático, porque, na ocasião, o médico pediu que eu me deitasse no chão e, em seguida, que me levantasse e que me colocasse de pé … pedido muito estranho, autoritário, e tarefa fisicamente difícil para mim. Senti que meus pais ficaram também desentendidos com aquela situação.
No final da consulta, o médico deu seu parecer aos meus pais, que acredito ter sido as primeiras palavras sobre o que vinha ser um diagnóstico, ou seja, de que eu era portador de uma “doença muscular”. Isso aconteceu graças àquele teste de me levantar. Tratava-se do sinal clínico chamado de SINAIS DE GOWERS, também conhecido como manobra do levantar miopático.
A fraqueza da musculatura proximal em uma criança, muitas vezes é associada a uma doença neuromuscular e pode ser avaliada pela MANOBRA DE GOWERS.
Os músculos proximais são os músculos que se encontram próximos do tronco, incluindo a parte superior das pernas, quadril, a parte superior dos braços, os ombros e o próprio tronco.
Na Manobra de GOWERS, pede-se que a criança se deite no chão com a barriga para cima e levante até se colocar de pé. A manobra é positiva (sinalizando fraqueza muscular proximal) quando a criança se apoia no chão, e literalmente precisa escalar o próprio corpo, ou as coxas para se levantar (ver figura).
Manobra de Gowers - 1). A criança deitada com a barriga para cima, para se levantar, dado a sua fraqueza muscular, 2). precisa rolar, se colocando de bruços, estendendo seus braços e pernas separados, 3). com a maior parte do peso do tronco apoiando nos braços estendidos, se empurra o corpo para trás para transferir o peso do tronco para as pernas estendidas. 4). Para estender o quadril, a criança coloca as mãos nos joelhos, 5). e sobre os braços pelas coxas, 6). como se estivesse escalando o próprio corpo, 7). até ficar de pé.
A Manobra de Gowers são sinais de movimentação física descritos e deixado como contribuição para a ciência neurológica, oriundo de observações feitas por Sir William Gowers. Gowers, foi um neurologista, Inglês do final do século XIX, que passou sua vida profissional trabalhando no National Hospital for the Relief and Cure for the Paralyzed and Epileptic e no University College Hospital na Queen Square, em Londres, Reino Unido, e após suas próprias observações clínicas, deixou registrado em seu livro Manual of the Diseases of the Nervous System, a descrição dos Sinais de Gowers, composto por uma sequência de sinais observados durante movimentação física, e que eventualmente poderá indicar fraqueza muscular proveniente de uma patologia neuromuscular.
Por fim, gostaria de terminar esse texto destacando os Sinais de Gowers por sua grande importância no exame clínico durante a consulta médica e eventual diagnóstico de uma doença muscular.
Dado à seriedade deste assunto, devo iniciar o texto com as palavras conclusivas sobre o tema… a HIPERTERMIA MALIGNA é uma doença grave, com risco de morte, que se apresenta em forma de crise, acionada por um gatilho, que é normalmente uma droga anestésica, sendo os portadores de mutação no gene RYR1, os indivíduos com maior risco de ser afetado, daí a afirmação, “HIPERTERMIA MALIGNA, PONTO DE ATENÇÃO PARA OS MÉDICOS ANESTESISTAS, PREOCUPAÇÃO PARA OS PORTADORES DE MUTAÇÃO DO GENE RYR1”. Os anestesistas devem ter o conhecimento sobre a doença e assumir que todas as pessoas com mutação no gene RYR1 correm risco de Hipertermia Maligna. No caso de qualquer procedimento médico que seja necessário anestesia, o portador de mutação de no gene RYR1 deve fazer com que o cirurgião e anestesista saiba sobre sua mutação no gene RYR1, portanto com Suscetibilidade a Hipertermia Maligna (MHS), assumindo assim os eventuais riscos, para tomar precauções e administrar um tipo seguro de anestésico. É recomendado também aos portadores da mutação do RYR1 que portem uma identificação de advertência médica indicando seu risco de HM, em caso de emergência, neste caso, um adesivo em todos os documentos pessoais (Ex.: Identidade, CNH, Passaporte, Carteira do Plano de Saúde, e etc).
CONCEITO
A Hipertermia Maligna (HM) é uma patologia de relação farmacogenética. E isso significa que a doença se manifesta através de um episódio/crise em indivíduos que tenham uma suscetibilidade genética, devido a uma mutação em um determinado gene, acontecendo caso sejam expostos a gatilhos anestésicos (fármacos = medicamentos). Essa predisposição é chamada de "Suscetibilidade à Hipertermia Maligna” (MHS). Genericamente, explica-se que a Hipertermia Maligna (HM) é uma reação biológica em que o corpo humano superaquece a ponto de um colapso muscular, e é considerada uma emergência médica. Se alguém com Hipertermia Maligna não for tratado a tempo, como consequência pode resultar em insuficiência renal, dano cerebral, parada cardíaca, falência de órgãos adicionais, e até morte.
Os indivíduos com Suscetibilidade à Hipertermia Maligna (MHS) podem também apresentar uma crise em resposta a outros gatilhos externos, como por exemplo, ao esforço físico, que poderá causar a Rabdomiólise (quebra muscular), e neste caso apresentando outros sintomas, tais como, cãibras severas, rigidez muscular, e intolerância ao calor.
A genética à Suscetibilidade à Hipertermia Maligna (MHS) é complexa, e vários genes têm sido identificados desempenhando um papel patogênico na Hipertermia Maligna, sendo o RYR1 o mais estudado. Este gene codifica o receptor 1 de Ryanodina (RyR-1), uma proteína do canal de cálcio do retículo sarcoplasmático, expressa predominante na célula muscular. Sabe-se que na maioria dos casos da Suscetibilidade à Hipertermia Maligna (MSH), ela apresenta um traço autossômico dominante, e isso significa que se você tem MHS, um de seus pais provavelmente também tem a MHS. Também significa que cada um de seus filhos têm 50% de chance de herdar a MHS. No entanto, a dita complexidade se prova quando os médicos também observaram a Hipertermia Maligna em pessoas com mutações RYR1 autossômicas recessivas.
Em alguns casos, ao contrário do que se pensa, a Suscetibilidade à Hipertermia Maligna (MHS) pode ocorrer na ausência de fraqueza muscular, em outras palavras, os indivíduos com MHS têm força normal ou até mesmo aumentada, e seu único “sintoma” é a suscetibilidade a reações de Hipertermia Maligna (HM). Por outro lado, a MHS também pode ocorrer em pacientes com Doenças Relacionadas ao RYR1 (RYR-1-RD) com sinais e sintomas típicos de miopatia (fraqueza muscular). Os gatilhos para Hipertermia Maligna incluem certos medicamentos usados para anestesia geral, ou seja, quando alguém é “colocado para dormir”, geralmente antes de uma cirurgia. A anestesia geral é usada em uma ampla variedade de ambientes, incluindo salas de cirurgia, salas de emergência e unidades de terapia intensiva (UTI). Medicamentos específicos conhecidos por desencadear a Hipertermia Maligna incluem anestésicos administrados por via intravenosa, e inalatória via tubo respiratório, como segue:
Mutações no RYR1 associadas a Hipertermia Maligna (HM) mostram uma penetrância variável, e isso significa que uma pessoa pode passar por várias exposições a gatilhos sem problemas antes que uma reação de HM ocorra pela primeira vez. Para tornar as coisas ainda mais confusas, as pessoas com a mesma mutação (incluindo membros da mesma família) podem ter reação clínica diferente, o que significa que algumas podem ser sensíveis ao calor, algumas podem ter reações de HM à anestesia, algumas podem ter rabdomiólise com exercícios físicos, e algumas podem não ter problemas com nenhuma dessas condições.
QUADRO CLÍNICO
O quadro clínico de um episódio/crise de Hipertermia Maligna é variável, e compreende manifestações de alterações metabólicas, de lesão muscular, e das complicações secundárias. Esta condição é expressa por rigidez muscular, aumento do consumo de oxigênio e produção de gás carbônico, acidemia (respiratória e metabólica), taquicardia, taquipnéia, hiperpotassemia, rabdomiólise e mioglobinúria. A dessaturação da hemoglobina no sangue arterial pode ser identificada por oximetria de pulso. Entre os diversos fatores que potencialmente contribuem para a dessaturação persistente, encontram-se acidemia, hipercarbia e hipertermia, capazes de deslocar a curva de saturação da hemoglobina para a direita. A hipercarbia, já detectada na cartografia, parece preceder as demais manifestações. A forma fulminante da Hipertermia Maligna é caracterizada por hipercapnia, rigidez muscular, hipertermias graves, e rabdomiólise, mas situações como cirurgias cardíacas sob circulação extracorpórea (CEC) com hipotermia podem atenuar a expressão clínica da Hipertermia Maligna (HM). A hiperventilação pode mascarar o diagnóstico de HM. Bloqueadores neuromusculares podem retardar o início das manifestações da crise de HM. Convém destacar que nem sempre hipertermia é manifestação inicial ou proeminente da HM. A rigidez muscular pode inexistir em 25 % dos casos, e a Hipertermia ser registrada em apenas um terço deles. A HM surge a qualquer momento durante a anestesia, tendo sido descrita sua ocorrência até 3 horas após a interrupção da exposição ao agente desencadeante (gatilho). A crise de Hipertermia Maligna (HM) pode manifestar-se tardiamente, mesmo após a interrupção da administração do agente desencadeante (gatilho), talvez a imobilidade determinada pela própria anestesia limite a liberação de cálcio a partir do retículo sarcoplasmático. Ao acordar, aumenta a atividade muscular e, na presença de resíduos anestésicos, vêm-se potencializadas à liberação intracelular de cálcio e seus efeitos metabólicos. Tem-se a impressão de haver diferenças entre os halogenados com relação ao seu potencial para desencadear crises de Hipertermia Maligna (HM). O halotano parece ser o de maior risco. A exposição ao isoflurano pode associar-se à crise de HM de início tardio. Parece que a indução da liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático pelo sevoflurano é menos intensa em comparação aos demais agentes.
Observação de Manifestações Clínicas Iniciais: Taquicardia - 96,0%, Rigidez muscular - 83,6%, Instabilidade hemodinâmica - 85,5%, Taquipnéia - 85,0%, Cianose - 71,1%, Hipertermia - 30,0%
TERAPIA
Dada a gravidade da doença, o tratamento da Hipertermia Maligna no regime operatório deve ser iniciado em caráter de emergência. A administração do anestésico deve ser interrompida imediatamente, e o paciente deve então receber infusão intravenosa de dantroleno sódico, um relaxante muscular que restaura os níveis fisiológicos de cálcio nos músculos.
Posteriormente, o paciente é induzido a baixar a temperatura corporal por meio de fluidos frios e bolsas de gelo para evitar consequências no cérebro, e é administrado oxigênio para satisfazer o aumento da demanda do organismo. Além disso, a acidose metabólica induzida por lactato é prontamente tratada e o desequilíbrio eletrolítico corrigido. O sucesso da intervenção depende em grande parte da rapidez no reconhecimento dos sintomas e da resposta individual do paciente à terapia.
Nos últimos trinta anos, graças a novos estudos e descobertas no campo farmacológico, a taxa de mortalidade da hipertermia maligna caiu drasticamente, de 70-80 % para 5%, tornando-se uma doença relativamente manejável e tratável.
Foi através do RYR1 Foundation que tive a grande honra e prazer em ter conhecido a Dra Isabelle Marty, PhD, uma cientista que trabalha no INSERM, French National Institute for Medical Reserach. Ela gerencia o C-MyPath (Cellular Myology and Pathology), um centro de pesquisas focado nas doenças neuromusculares, coordenando uma equipe de cientistas, geneticistas, e médicos do Grenoble Institute of Neuroscience na França. Durante meu encontro com a Dra Isabelle, externei a ela sobre nossa ansia como portadores da Miopatia Congênita Centronuclear, uma doença relacionada ao gene RYR1, sobre o aparecimento da cura ou mesmo de um tratamento para a doença, e como contribuição ao SORRYR-1, ela gentilmente enviou um artigo relatando o que está acontecendo nas bancadas de laboratórios de grandes centros de pesquisas científicas ao redor do mundo. O texto reforça meu entendimento de que SER OTIMISTA COM NOSSO FUTURO, É TER FÉ EM DEUS, E ACREDITAR NA CIÊNCIA TRABALHANDO EM NOSSO BENEFICIO.
Segue o texto (tradução por Orlando Carneiro Jr)…
DESENVOLVIMENTO TERAPÊUTICO EM PROGRESSO PARA MIOPATIAS RELACIONADAS AO RYR1
Ainda não existe nenhum tratamento para as miopatias relacionadas ao gene RYR1, em parte devido ao número de mutações, mas também pela diversidade de suas consequências. Um pré-requisito para o desenvolvimento terapêutico para a doença é a disponibilidade de modelos de pesquisa (cobaias) que reproduzam as características da doença, assim como ter uma boa compreensão dos mecanismos fisiopatológicos (funcionamento da doença). Contudo, esses dois aspectos estão em rápida evolução, pois muitos modelos celulares ou animais (cobaias) foram desenvolvidos recentemente, e diferentes abordagens estão sendo avaliadas, seja em pesquisas básicas, em estudos pré-clínicos, ou mesmo em ensaios clínicos (clinical trials). Estes estudos podem ser classificados como “estratégias gerais”, tendo como alvo o mecanismo fisiopatológico normalmente verificado em diferentes mutações/pacientes, tais como moléculas químicas, ou “estratégia orientada personalizada ao paciente”, tendo alvo a mutação específica de cada paciente, como exemplo a terapia gênica.
As abordagens farmacológicas visam testar moléculas que interagem com gene RYR1 ou com suas proteínas associadas, visando sempre na busca de melhorar a função do canal ou as vias fisiológicas do RYR1. Por outro lado, a terapia gênica foca diretamente o gene mutado ou via mRNA para corrigir a própria proteína do RYR1, restaurando assim a expressão funcional da proteína. Em ambas as abordagens, o objetivo é restaurar a homeostase normal do cálcio e, posteriormente, a força muscular.
ABORDAGENS FARMACOLÓGICAS
O uso de compostos químicos para corrigir as alterações funcionais do gene RYR1 baseia-se na decifração precisa dos mecanismos fisiopatológicos e na identificação de moléculas que atuam no mecanismo alvo, geralmente capazes de restaurar a homeostase do cálcio. Esses compostos podem atuar diretamente no RYR1, alterando suas propriedades, conformação e/ou interação com proteínas reguladoras, a fim de restaurar o fluxo normal de cálcio, mas também de agir nas consequências causadas pela alteração do curso do fluxo de cálcio. Cada mutação pode resultar em diferentes mecanismos fisiopatológicos, por isso é importante identificar diferentes famílias de moléculas, para os diferentes mecanismos. Outro aspecto importante é o uso prévio ou já utilização de compostos químicos para humanos, o que poderia reduzir drasticamente o atraso entre a prova de conceito da eficácia e seu lançamento à comercialização.
Em se tratando de estudo dos mecanismos fisiopatológicos, a primeira alteração celular identificada é um elevado estresse oxidativo, observado em muitos modelos portadores de miopatias relacionadas ao RYR1, de zebrafish a camundongos, e em cultura muscular primária em pacientes. Seguindo essa linha, foi testado com sucesso nesses diferentes modelos, o tratamento com o antioxidante N-Acetilcisteína (NAC) resultando na melhora de suas características moleculares e fisiológicas. Esses resultados encorajadores observados nos referidos modelos, levaram pesquisadores a promover ensaios clínicos a fim de testar a eficácia do NAC para diminuir o elevado estresse oxidativo, assim como aumentar a resistência física em pacientes com miopatias relacionadas ao RYR1. Esse estudo com NAC confirmou o aumento do estresse oxidativo nos pacientes portadores de doenças relacionadas ao RYR1, mas o tratamento não foi capaz de corrigir esse aumento em comparação ao grupo placebo. Do ponto de vista funcional, o resultado embora tenha sido medido um ligeiro aumento na distância percorrida (6MWT - six minute walk test ), não atingiu valores com significância.
O segundo mecanismo alterado com algumas mutações é a interação do RYR1 com sua proteína de ligação, ou proteína reguladora FKBP12 (também chamada calstabina), a qual visa manter o canal de cálcio do RYR1 eficientemente fechado. A consequência dessa alteração é um vazamento do cálcio contido nas reservas de cálcio do músculo, fazendo com que a estimulação do músculo não levará a uma liberação de cálcio suficiente para produzir uma contração normal. Pesquisadores identificaram moléculas denominadas RyCals, capazes de reduzir esse vazamento de cálcio, trazendo assim a abordagens terapêuticas promissoras. Testes clínicos foram lançados pela ARMGO Pharma Inc, em um número restrito de pacientes que apresentaram um “RYR1 com vazamento" confirmado, fornecendo resultados encorajadores sobre tolerância e dor muscular. O benefício agora deve ser confirmado no nível de força muscular em um grupo maior de pacientes.
As proteínas são classes de macromoléculas biológicas de maior importância no metabolismo celular e na fisiologia dos organismos, e alguns mecanismos celular naturais, como o enovelamento de proteínas (protein folding), também mostraram ser alterados, o que faz com que a célula não desempenhe sua função correta, e o tratamento de alguns modelos de camundongos com 4-fenilbutirato de sódio (4-PBA), droga que melhora o enovelamento de proteínas, mostrou algum benefício no animal, mas ainda não foi testado em humanos.
Muitas equipes de pesquisadores ao redor do mundo estão trabalhando para identificar moléculas que possam melhorar a liberação de cálcio muscular, seja no reposicionamento de moléculas usadas para outras condições (drogas já utilizadas para outras doenças), ou para identificar novas moléculas que nunca foram testadas em animais ou humanos (nova droga).
TERAPIA DE GENES
Uma vez identificada a mutação responsável por uma doença, o objetivo das abordagens de terapia gênica é modificar o genoma das células do indivíduo afetado para corrigir essa mutação e restaurar de forma sustentável a função alterada caracterizada na patologia. Uma questão importante para as doenças neuromusculares é a capacidade de atingir todos os músculos do corpo e especialmente os músculos respiratórios (diafragma e músculos intercostais) que estão entre os menos acessíveis à injeção. Existem várias maneiras de desenvolver uma estratégia gênica, dependendo da mutação alvo, sua localização na sequência de DNA, e suas consequências na função proteica.
A substituição gênica, é a introdução de uma cópia nova e funcional de um gene alterado através de um vetor viral, estratégia considerada interessante para as mutações de perda de função. O uso de um vetor viral como o Vírus Adeno-Associado (AAV) permite com uma única injeção intravenosa, atingir todos os músculos do corpo, mesmo os músculos respiratórios e diafragma menos acessíveis. Um resultado espetacular da terapia genética foi obtido para Atrofia Muscular Espinhal (AME). Esta promissora abordagem terapêutica tem, infelizmente, algumas limitações, relacionadas com a capacidade de empacotamento do vetor viral utilizado. Atualmente, não é possível integrar a sequência de codificação do RYR1, que é muito grande, nem é possível integrar uma versão truncada mais curta e funcional do RYR1.
Quando a correção no gene é muito complexa, como por exemplo nos genes grandes, uma estratégia alternativa é direcionar o mRNA, chamado de RNA mensageiro, que funciona carregando a informação entre o gene e a proteína. A correção do RYR1 via mRNA é especificamente adequada para um subgrupo de mutações, no caso, as mutações que resultam na presença de um segmento adicional na proteína (o chamado "exon"), para o qual a estratégia "exon skipping" que não modifica o gene que possui a mutação, mas ele interfere e modifica o processo de transferência da informação genética e, portanto, as instruções ou mecanismos de funcionamento do RYR1. Esta abordagem tem mostrado resultados extremamente encorajadores e está em desenvolvimento clínico para algumas doenças neuromusculares entre as quais Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) e Atrofia Muscular Espinhal (SMA - Spinal Muscular Atrophy).
Um novo campo de trabalho surgiu recentemente e está crescendo exponencialmente, que é a correção gênica por CRISPR/Cas9. A base deste sistema de edição de genes, também chamado de “tesoura molecular”, é separar o DNA em um local muito específico e escolhido, a fim de deletar uma parte do DNA (por exemplo a que contém a mutação) e assim substituí-la por um novo DNA ( sem a mutação). Até agora, para doenças musculares em modelos animais, só era possível deletar um segmento de DNA mutado, mas não substituí-lo. Mas o avanço tecnológico está evoluindo em uma velocidade impressionante e novas ferramentas de edição de genes estão sendo desenvolvidas, capazes teoricamente de corrigir qualquer mutação, pelo menos em modelos celulares, como por exemplo o Prime-editing, ferramenta mais complexa que a edição CRISPR/Cas9, porque ela pode excluir comprimentos longos de DNA causador de doença ou mesmo inserir DNA para reparar mutações.
A terapia gênica é um novo desafio para doenças genéticas, a qual era apenas um sonho há 20 ou 30 anos atrás. Apesar de todos os desafios que a abordagem de edição genética está enfrentando, soluções devem ser encontradas antes de passar para um tratamento real em humanos, além de uma série de questões éticas que foram levantadas por esta nova tecnologia, a terapia gênica e edição de genoma parecem ter o maior potencial terapêutico a longo prazo.
CONCLUSÃO
Embora nenhum tratamento esteja disponível para as doenças relacionadas ao RYR1, as vias terapêuticas estão sendo exploradas ativamente. Da terapia farmacológica mais antiga, usada há muito tempo, com efeitos colaterais conhecidos e benefícios mais ou menos modestos, à mais nova terapia genética com efeitos colaterais desconhecidos e enormes benefícios potenciais esperados, a terapia intermediária perfeita ainda precisa ser descoberta. Ou seja, uma combinação de diferentes abordagens pode ser uma boa alternativa, como um composto químico capaz de reduzir a quantidade de vetor viral necessária para terapia gênica, melhorando a entrada no músculo, ou melhorando a estrutura muscular. Embora os sucessos recentes em diferentes doenças neuromusculares provavelmente tenham gerado novas esperanças, a pesquisa ativa deve continuar nas duas direções, pois ainda é difícil prever hoje qual será o futuro das terapias para as doenças relacionadas ao RYR1, sendo as terapias de curto e longo prazo provavelmente a milhas de distância.
ESPERANÇA AOS PORTADORES DE DOENÇAS RELACIONADAS AO RYR1 VISTA POR UM OUTRO LADO DO PRISMA
Na postagem anterior tratei sobre as boas notícias que tive durante o workshop científico sobre as doenças relacionadas ao RYR1 em Pittsburgh (EUA), em julho de 2022. Me referi às pesquisas sobre uma droga capaz de aliviar, tratar, e até curar as doenças relacionadas ao RYR1, mencionei inclusive sobre valores de investimentos em pesquisas e tendências de mercado para os próximos anos. Contudo pode ter ficado uma pergunta no ar, sobre o porquê do grande interesse em pesquisas tão dispendiosas sobre uma doença que atinge um pequeno número de pessoas. …então vamos buscar o raciocínio lógico…
Músculo é o tecido responsável pelo movimento do corpo humano. O mecanismo de funcionamento do músculo, ou seja, como ele contrai e relaxa, é chamado de acoplamento excitação-contração (EC), e tudo acontece na célula da fibra muscular, onde o citoplasma está localizado. Lá dentro, o Retículo Sarcoplasmático (RS) atua como reservatório para íons de cálcio, essenciais para desenvolver a força muscular. O receptor de Ryanodina Tipo 1 (RYR1) funciona como canal liberador dos íons de cálcio, o qual quando liberado no citoplasma, faz com que o músculo se contraia. Na prática o mecanismo de funcionamento é simples, quanto mais íons de cálcio liberado no citoplasma, mais força muscular o indivíduo desenvolve.
O cientista Andrew R. Marks, MD, professor de fisiologia e biofísica celular na Universidade de Columbia (EUA), explica em seus estudos que a perda da função muscular é associada à disfunção dos canais de liberação do receptor de rianodina (RYR1) do músculo, e que pode ser causado por uma falha decorrente a uma mutação genética, ou devido à sobrecarga oxidativa celular relacionada à idade. Essa falha desestabiliza o estado fechado do canal, resultando em um defeito pelo vazamento de cálcio intracelular, acarretando em função muscular reduzida, o que explica não somente as doenças relacionadas ao RYR1, mas também explica no caso da oxidação celular, a razão pela qual os exercícios físicos se tornam mais difíceis com a idade.
A boa notícia é que existe uma droga em fase de testes que pode barrar esse vazamento. Na pesquisa foram estudadas as células musculares de ratos novos e velhos. Um rato de seis meses cujos receptores de rianodina vazavam cálcio mostraram os mesmos problemas de fraqueza muscular do que um rato mais velho. Este, por sua vez, apresentou melhoras depois de ser tratado com a droga em teste. O estudo sugere aos cientistas procurarem por novos caminhos no tratamento do envelhecimento. “As pesquisas que temos visto se focam em produzir mais músculos”, diz Andrew Marks. “E a diferença é que nós focamos não no músculo, mas no seu mecanismo de funcionamento, pois o aumento de músculos não ajuda se eles não funcionarem.”
Portanto, entendo que quando a comunidade científica desenvolve pesquisas em busca de uma droga capaz de tratar e até curar as doenças musculares relacionadas ao RYR1, se busca também beneficiar todos os indivíduos, porque a fraqueza muscular decorrente do envelhecimento é comum a todos. Assim, podemos pensar que o interesse mercadológico para a descoberta de uma droga capaz de atuar no defeito ou mal funcionamento da célula muscular, pode ser maior por ir de encontro com a necessidade de todos os indivíduos, e não somente aos portadores de doenças relacionadas ao RYR1. Por fim eu faço a seguinte analogia, nós portadores de uma doença relacionada ao RYR1 temos um defeito de fábrica, que é a mutação genética, e os indivíduos saudáveis terão um defeito por conta do tempo ou idade, que é a oxidação celular.
O WORKSHOP COM PESQUISADORES DE 8 PAISES DIFERENTES QUE ACONTECEU DURANTE A CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE DOENÇAS REALCIONADAS AO RYR-1 REALIZADA EM JULHO DE 2022 EM PITTSBURGH, EUA, TROUXE GRANDES NOVIDADES SOBRE PESQUISAS EM BUSCA DE TRATAMENTO E CURA DA DOENÇA
A descoberta de qualquer doença, nunca é algo esperado, é bem desagradavel, e no caso de uma doença grave será sempre uma novidade traumática. Acontece que na grande maioria das doenças existe a opção ao afetado de um tratamento que funciona como um alento e até motivação para o novo momento que será vivido até que se alcance sua cura. Contudo, existem aquelas doenças com prognóstico evolutivo, que não contam com tratamento, muito menos cura, e que fazem com que só reste ao afetado ter que encarar a realidade do diagnóstico, e desenvolver por si só meios para conviver com suas dificuldades, sejam as físicas e as emocionais.
Recentemente participei da Conferência Internacional sobre as Doenças Relacionadas ao RYR-1, que contou com a presença de mais de 200 pessoas entre afetados e familiares, evento este que foi precedido por um workshop que reuniu 45 pesquisadores presenciais e 10 virtuais de 8 países diferentes, os quais compartilharam seus trabalhos em busca de tratamento ou cura da doença. O evento além de promover a sociabilização entre os participantes, teve como objetivo, através dos palestrantes, informar questões conceituais sobre a doença, até às novidades sobre as pesquisas para tratamentos da doença.
Como as doenças relacionadas ao RYR1 ainda não contam com tratamento, muito menos cura, foi natural observar a grande ansiedade entre os presentes em saber sobre as novidades do andamento das pesquisas em busca de uma droga capaz de aliviar sintomas e tratar as complicações causadas pela doença.
Providencialmente os cientistas palestrantes foram portadores de boas notícias que vieram de encontro com o anseio dos presentes, e informaram que estão trabalhando ativamente por meio de várias abordagens de pesquisas em busca por uma droga capaz de aliviar os sintomas da doença, contudo este é um processo bem complexo, e normalmente leva muitos anos e altos custos de investimentos.
Falando em alto custo, algo que parecia tão distante, mas que já faz parte de nossa realidade, foi pessoalmente abordado por Jacques Tremblay, PhD, cientista responsável da University of Laval, Québec, Canadá, pelas pesquisas da terapia de reposição gênica através da correção da mutação pontual no gene RYR1 usando a tecnologia de edição CRISPR/Prime editing technology. Com a “edição de genes”, o objetivo é corrigir ou “editar” apenas uma pequena parte do gene “defeituoso”, oferecendo assim o potencial de cura para doença, não apenas um tratamento.
Várias pesquisas de medicamentos estão em desenvolvimento como terapias potenciais para as doenças relacionadas ao RYR1 (DR-RYR1). Para mim a grande novidade foi saber que alguns desses medicamentos já estão aprovados para outras doenças, e os pesquisadores estão testando o “reposicionamento dessas drogas” para as doenças relacionadas ao RYR1 (DR-RYR1), como por exemplo, MitoQ, Dantroleno, Ácidos Graxos Poli-insaturados, Salbutamol, Piridostigmina, NAC (N-Acetil L-Cisteína), dentre outros. Algumas destas drogas têm como alvo o próprio receptor RYR1, outras visam características e sintomas específicos das DR-RYR1. O reposicionamento de fármacos (medicamentos) consiste na técnica de pesquisa e identificação de novas indicações terapêuticas além dos já conhecidos. O seu desenvolvimento clínico requer menos tempo e menos etapas, visto que o perfil de segurança do medicamento já é conhecido, demonstrado e aprovado, assim como por ter um investimento mais baixo. A pesquisa de novas indicações terapêuticas pressupõe abordagens experimentais e computacionais que busquem identificar e gerar novas hipóteses de interações fármaco-alvo desconhecidas até então. Exemplos conhecidos de reposicionamento de fármacos é o Viagra, que foi inicialmente desenvolvido para tratar hipertensão e angina, mas que durante as etapas de estudo clínico acabou sendo direcionado para tratar disfunção sexual masculina, e outro famoso foi o caso da Zidovudina (AZT), primeiro fármaco aprovado para tratamento da AIDS, e cuja indicação original era o câncer.
Outra grande novidade foi saber sobre o RYCALS, que é uma nova classe de medicamentos que atua diretamente no receptor RYR1, estabilizando e melhorando a ligação de RYR1 e calstabina, restaurando assim a vedação para evitar vazamento de cálcio, situação essencial para o bom funcionamento da célula muscular. Pesquisadores mostraram que o tratamento com RYCALS restaura a função muscular em camundongos in vivo e no tecido muscular humano ex vivo. Especificamente, um estudo recente mostrou que RYCALS melhorou a ligação da calstabina a o receptor RYR1 em células musculares retiradas de biópsias de pacientes com doenças relacionadas ao RYR1. No final do ano de 2021, a ARMGO Pharma, desenvolvedora do RYCALS, recebeu um investimento de US$ 35 milhões de uma empresa europeia de capital de risco. Um teste clínico humano de Rycals foi concluído . O Dr. Payam Mohassel, membro da Fundação RYR-1 e investigador principal do estudo RYCALS, fez uma apresentação muito antecipada na Conferência da Família que resumiu as principais descobertas deste importante estudo. Especificamente, o estudo revelou que o RYCALS foI bem tolerado pelos pacientes sem efeitos colaterais. Embora o estudo tenha sido pequeno, demonstrou algumas tendências promissoras em testes que mediram os sintomas de fraqueza e fadiga dos pacientes. Diante dessas descobertas, o Dr. Mohassel e a equipe de desenvolvimento clínico do RYCALS acreditam que o desenvolvimento clínico adicional da droga é garantida.
Por fim, eu fico muito animado por saber que, corroborando com o relato acima descrito, de acordo com informações obtidas da Data Bridge Market Research , empresa de análise de mercado, espera-se que o mercado de pesquisas farmacêutico de doenças relacionadas ao receptor de rianodina tipo 1 (RYR1) cresça 6,40% a uma taxa anual composta (CAGR) no período de previsão de 2021-2028.
UM TESTEMUNHO DE VIDA DE UM PORTADOR DE MIOPATIA CONGENITA CENTRONUCLEAR EM MEIO ÀS ADVERSIDADES DA DOENÇA
A Fundação RYR-1 sediará em julho de 2022 o primeiro Workshop Internacional de Pesquisa em Doenças Relacionadas ao RYR-1, reunindo um grupo internacional de especialistas, cientistas pesquisadores, assim como um seleto grupo de indivíduos afetados por uma doença relacionada ao RYR-1. Neste encontro deverá acontecer um intercambio de informações sobre os mecanismos das doenças relacionadas ao RYR1, a posição atual sobre as pesquisas em curso e perspectivas futuras de tratamentos, mas o mais importante para nós afetados pela doença, é que teremos a oportunidade de expor nossas experiências, queixas, como a doença evolui e nos afeta no dia a dia.
Eu, como portador de Miopatia Congênita Centronulear, fui um dos indivíduos convidados a participar deste encontro, e pretendo na oportunidade oferecer insights pessoais visando ajudar os pesquisadores e clínicos a entender melhor como essa doença afeta nossos corpos nas várias fases e situações da vida. Para melhor conhecimento dos cientistas e pesquisadores presentes, nós convidados, deveremos fazer uma apresentação pessoal, como um histórico de toda a vida sobre nossa relação com a doença.
Em última análise, a partir de nossas histórias, fico na esperança que os cientistas com a compreensão aprimorada, possam mediante as informações recebidas incrementar suas pesquisas para produção de drogas e terapias eficazes em nosso benefício.
Atendendo a sugestão de pessoas que previamente tomaram conhecimentos do meu histórico de vida, reproduzo abaixo o texto base sobre o que será minha exposição no referido evento, o tornando assim de conhecimento de todos.
Meu nome é Orlando, brasileiro, moro em Goiânia, GO, cidade localizada na região centro oeste do Brasil. Minha história de vida começa em 1963, e este texto está focado na minha saúde física. Gostaria de começar dizendo que apesar de não ter sofrido complicações durante a gravidez da minha mãe, nem problemas no parto, meu desenvolvimento físico foi marcado desde o início da minha vida pelo atraso motor e pela hipotonia já notada no primeiro ano de vida. Vale ressaltar que eu já tinha um casal de irmãos fisicamente normais, livres de doenças.
Na época, em meados da década de 1960, diante das limitações científicas e do pouco conhecimento médico disponível em Goiânia, cidade onde morava, aos 7 anos, meus pais decidiram ir em busca de explicações e diagnóstico sobre o que estava me afetando fisicamente, e assim fomos para São Paulo, um grande centro médico do Brasil. Eu já apresentava marcos motores preocupantes, como a manobra de Gowers, dificuldade para subir degraus, dentre outros. Uma biópsia muscular veio comprovar relatando sinais inusitados e inespecíficos no tecido (somente coloração de H&E e trinômio de Masson), mas o neurologista limitou-se a dizer que eu estava acometido por uma potencial doença neuromuscular, e não foi indicado nenhum tratamento a ser realizado.
Em 1970, nasceu minha irmã, o que na época causou à família um misto de alegria pelo seu nascimento, mas preocupação porque ela já dava sinais claros de que também era acometida pela mesma doença inespecífica que me acometia. Meus pais, preocupados com a situação decidiram levar eu e minha irmã, ainda bebê, para outro grande centro médico, desta vez para o Departamento de Estudos Neurológicos da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Lá, mais exames foram realizados, incluindo um eletromiografia, e desta vez nos foi dada uma hipótese de diagnóstico clínico de um tipo de Distrofia Muscular. Na ocasião o médico conversou com meus pais sobre as características e prognóstico daquela doença, assim como recomendou cuidados especiais com exercícios físicos para evitar uma possível progressão da doença, mas nada foi indicado como tratamento.
Durante minha infância e adolescência, mesmo considerando minhas dificuldades e as claras diferenças em relação às outras crianças, fui muito ativo, e tentei fazer tudo, nadei, andei de bicicleta, enfim, brinquei muito. Fui criado e ensinado de uma forma que não focava no que eu não podia fazer, mas no que eu queria e era capaz de fazer dentro das minhas habilidades. Ao longo dos anos, experimentei um padrão de piora física lenta, mas constante, tais como a dificuldade em subir escadas, levantar de uma cadeira, andar, manter o equilíbrio e riscos de queda. Emocionalmente também sofri muito por vezes me sentir diferente dos meus colegas, mas ao mesmo tempo em que fui fortemente apoiado pelos amigos e familiares, me fazendo sentir normal, mesmo sendo uma criança fisicamente anormal.
As dificuldades que sempre enfrentei na vida, me fizeram desenvolver um instinto de superação e de busca pela Independência. Casei-me muito jovem, aos 19 anos, quando ainda cursava faculdade. Já casado, aos 21 anos, mudamos para os EUA fazer meu MBA. Naquela época pensavaos em ter filhos, mas diante da falta de conhecimento e certeza sobre a doença que me acometia, por termos ouvido falar do MDA - Associação de Distrofia Muscular, fomos lá em busca de respostas e aconselhamento. Fomos a uma clínica associada em Austin, Texas, cidade onde morávamos, e consultados pelo Dr Jerry Tindel, que após uma bateria de exames, recebi o diagnóstico de Distrofia Muscular, sugerindo ser do tipo FSH-Facioscapulohumeral. Na consulta me foi explicado sobre a gravidade da doença, seu prognóstico, a probabilidade de ter um filho também afetado pela doença, e concluir dizendo que em poucos meses eu estaria em cadeira de rodas, contudo, nenhum tratamento me foi prescrito.
De volta ao Brasil, a vida continuou, e nos anos que se seguiram, as décadas de 1980 e 1990, minhas dificuldades físicas aumentaram, era sinal da evolução da miopatia, eu não conseguia mais me levantar de uma cadeira, e precisava usar uma bengala para apoiar minha caminhada e equilíbrio, mas ao contrário do que o médico do MDA tinha dito, eu não precisava de usar cadeira de rodas. Neste período estive muito envolvido com meus projetos profissionais e familiares. Eu tive um casal de filhos, e ambos nunca mostraram sinais de serem afetados pela doença. Luciano, meu filho mais velho, apesar de ter falecido aos 23 anos vítima de leucemia, durante sua vida como prova de sua capacidade física se tornou atleta de triathlon, e conquistou a medalha de bronze aos 20 anos no Campeonato Mundial de Triatlo em Vancouver, Canadá, o que demonstrou não ser portador de nenhuma miopatia. Priscila, nossa filha caçula, hoje é médica e casada, e é fisicamente normal, mas carrega uma mutação no gene RYR-1.
No ano de 2000, incomodado com a progressão e piora física com aumento da limitações impostas pela doença, porém não tão grave como dizia em 1985 o médico do MDA, fui novamente em busca de respostas, e desta vez acreditando na evolução científica marcada pela mudança do século. Procurei pelo que existia de mais avançado na ciência, e fui consultado pela Dra Mayana Zatz, geneticista do Departamento de Genética Humana da USP - Universidade de São Paulo, em busca de um diagnóstico, contudo, mais uma vez me viram como portador de uma Distrofia Muscular, mas novamente sem um laudo conclusivo.
Inconformado com a imprecisão dos hipotéticos diagnósticos que recebi no decorrer da minha vida, finalmente, em 2007, aos 44 anos, conheci o Dr Acary Bulle Oliveira, neurologista e chefe do Setor de Doenças Neuromusculares da UNIFESP - Universidade Federal de São Paulo, e sendo consultado por ele, finalmente recebi um diagnóstico clínico e conclusivo, corroborado por biópsia muscular que evidenciou anormalidades da rede intermiofibrilar típicas de uma Miopatia Congênita Centronuclear, bem como resultado de exame genético e pesquisa com sequenciamento total do exoma mostrando alteração (mutação) no gene RYR1.
Dada a raridade da miopatia que me afeta, minha idade e situação física, e evolução da doença, em 2017 fui convidado a visitar o NIH - National Institutes of Health, Bethesda, Maryland, EUA, e consultado pelo Dr Carsten Bonnemann, MD., Senior Investigator and Chief of the Neuromuscular and Neurogenetic Disorder me coloquei a disposição para participar de eventual estudo de pesquisa. Esse momento foi muito impactante na minha vida, pois pela primeira vez percebi que haviam pessoas interessadas na minha doença, e que já estavam desenvolvendo pesquisas em busca de tratamento e até de cura. Na época, outro grande marco foi ter sido apresentado à Fundação RYR1, que é uma associação que visa reunir pessoas afetadas por doenças relacionadas ao RYR1 de todo o mundo, promover a troca de experiências entre os participantes (afetados e familiares), além de apoiar cientistas e laboratórios que trabalham no desenvolvimento de medicamentos para tratamento, a até a terapia genética curativa. Enfim, toda essa experiência me fez ver e prever algo que nunca tinha pensado, que é a cura, ou pelo menos a existência de um medicamento para tratar ou aliviar os efeitos da Miopatia Congênita Centronuclear.
(este texto foi escrito originalmente em inglês, e traduzido para o português para esta postagem)
Para entender os padrões de herança de uma doença genética, deve-se lembrar que todos os indivíduos têm duas "cópias" de cada gene, uma herdada da mãe e outra do pai, portanto você tem, herdado dos pais dentre outros genes, duas cópias do gene RYR1.
No caso de uma doença relacionada ao RYR1, geneticamente, existem dois tipos principais de padrões de herança para alterações no gene RYR1, o “Autossômica Recessiva”, e “Autossômica Dominante”, mas existe também um terceiro padrão de herança, chamado de mutações espontâneas ou “De Novo”. O termo “congênito” significa que os sintomas clínicos de uma doença relacionada ao RYR1 aparecem já no nascimento, ou mais comumente durante a infância, contudo, existem casos em que a doença pode apresentar na adolescência ou mesmo na idade adulta.
• Autossômica Dominante
Na herança autossômica dominante, uma cópia mutada do gene em cada célula é suficiente para que uma pessoa seja afetada. Em muitos casos, uma pessoa afetada herda a condição do pai ou da mãe afetada.
• Autossômica Recessiva
Na herança autossômica recessiva, ambas cópias do gene em cada célula têm mutações. Os pais de um indivíduo com uma condição autossômica recessiva carregam, cada um, uma cópia do gene mutado, mas geralmente não apresentam sinais e sintomas da doença.
• De Novo
Uma mutação que está presente pela primeira vez em um membro da família (e não está presente em nenhum dos pais biológicos) é chamada “De Novo”. Esta mutação ocorre no óvulo da mãe ou esperma do pai do indivíduo, respectivamente.