Home/

EU VI O MEU GENE RYR1 EM 3D E ENTENDI O QUE ACONTECE DENTRO DE MIM

outubro 14, 2025

EU VI O MEU GENE RYR1 EM 3D E ENTENDI O QUE ACONTECE DENTRO DE MIM

Desde que nasci, eu fui desafiado pelos sintomas de uma doença que me fazia ser diferente de outras crianças, ela me confrontava a todo tempo, me causava limitações físicas funcionais progressivas, e assim, causava a mim e à minha família um turbilhão de questionamentos e dúvidas sobre do que se tratava. Diante dos diagnósticos e prognósticos que recebia, dos mais piores possíveis, assim como pela falta de uma solução com um possível tratamento, eu, com toda minha inocência e intuito, resolvi que a melhor coisa que tinha a fazer era viver, e viver com intensidade, buscando a superação das minhas limitações, potencializando assim minha capacidade com o que tinha de físico, emocional, e intelectual. E sempre digo que apesar de tudo, eu nunca me vi no espelho como uma pessoa diferente, e neste contexto de vida, brinquei, namorei, me formei, casei, trabalhei muito, tive dois filhos, enfim, enquanto isso o mundo foi girando, a ciência descobrindo e explicando as coisas, até que quando tinha 44 anos, obtive meu diagnóstico sobre minha doença, ou seja, que tinha uma mutação no gene RYR1, e que me causava uma doença chamada de Miopatia Congênita Centronuclear, e que isso é que era a responsável pela condição que vivia desde que nasci. Pois bem, não mudou nada na minha vida, a não ser que descobri o endereço e nome da minha doença, o resto foi que ela era uma "Doença Rara",  incurável e sem tratamento, e por fim, que pouco se conhecia sobre ela no meio médico-científico.

Sempre fui uma pessoa muito resiliente, que não só tem a força interior para enfrentar a realidade, por mais dura que seja, mas também tem a ambição intelectual e pessoal para moldar ativamente minha realidade em uma vida melhor, ou como diz minha mãe, mais "suave". Sempre fui uma pessoa da mente muito aberta ao conhecimento, ao questionamento, à observação, ao aprendizado, e essas minhas características não me fizeram ser uma pessoa acomodada. Não saber a princípio qual era doença que me acometia, e posteriormente descobri-la, e o pior que não tinha cura ou tratamento, nunca me causou sentimentos negativos, muito pelo contrário, me impulsionou a buscar viver melhor, mas também ao conhecimento.

A busca pelo conhecimento teórico sobre o mecanismo de funcionamento do gene, o RYR1, e como ele interferia no meu corpo foi um grande marco para meu conhecimento intelectual, assim como satisfação interna para minhas ansiedades. Contudo, o conhecer de perto, praticamente quase podendo o “tocar”, foi uma de minhas maiores experiências que já tive nesta minha peregrinação em busca de saber sobre a doença que me acomete desde que nasci. E isso se deu, depois de muito tempo, especificamente, recentemente, na última Conferência de Família e Workshop de Pesquisa do RYR1, realizada em julho de 2025 em Pittsburgh, EUA, durante uma reunião particular com o Dr. Filip Van Petegem. Na oportunidade, pude assistir um vídeo com a reconstituição em 3D “do meu RYR1”, ao mesmo tempo que o escutava fazer uma explanação específica sobre minha mutação. Dr. Van Petegem lidera um laboratório de pesquisa no Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular na Universidade da Colúmbia Britânica (UBC), Vancouver, Canadá, no qual utiliza a cristalografia de raios X e microscopia crioeletrônica para estudar suas estruturas 3D, o que proporciona estudar a estrutura e função dos canais iônicos, com foco no músculo cardíaco e esquelético, e isso inclui o Receptor de Ryanodine (RyR). Um dos trabalhos do Dr Petegem consiste na importante abordagem em determinar as estruturas tridimensionais muito detalhadas desses canais do RYR1, permitindo a análise dos efeitos diretos das mutações na estrutura, e consequente interferência física no indivíduo afetado. 

 

A título ilustrativo e como exemplo, gostaria de compartilhar com o leitor dessa postagem um pequeno vídeo criado pelo Dr Van Petegem, a partir da técnica acima descrita, da variante do meu RYR1 com a respectiva mutação genética. O vídeo lhe permitirá entender melhor a complexidade da estrutura molecular do gene RYR1, descrita na postagem anterior, O GIGANTE DO GENOMA QUE FAZ OS MÚSCULOS SE MOVEREM, e que neste caso se trata do meu RYR1.

 

O Vídeo

Para orientar um pouco melhor a apresentação deste vídeo, e assim entender o que acontece com meu gene RYR1, veja a seguir algumas da partes importantes da apresentação:

1). cada esfera que você vê representa um átomo individual;

2). o vídeo começa com uma visão 'top', ou seja, por cima do RYR1. Olhando no fundo da parte central, está a região chamada de 'poro', onde os íons de cálcio podem passar;

3). o vídeo amplia a localização da minha variante, E1175K. O aminoácido do 'tipo selvagem' é o chamado 'E', também conhecido como 'Glu' ou 'Glutamato'. Este aminoácido tem a propriedade especial de carregar carga negativa. No vídeo, este E1175 é mostrado em vermelho;

4). pode-se ver que o E1175 está apontando para outro aminoácido em uma cor diferente, em azul. Esse aminoácido, conhecido como 'R' ou 'Arg' ou 'Arginina', é especial porque carrega uma carga positiva. Assim, em pessoas sem nenhuma variante RYR1, haverá normalmente uma atração entre o 'E' carregado negativamente em vermelho, e o 'R' carregado positivamente em azul;

5). na variante demonstrada (a minha no caso), o E1175 carregado negativamente é substituído por 'K'. Este aminoácido, também conhecido como 'Lys' ou 'Lysine', também carrega carga positiva. Portanto, a variante não apenas abole a interação positivo-negativa normal, mas também coloca um aminoácido carregado positivamente (K) ao lado de outro (R), e isso desestabiliza a proteína. Por causa disso, o RYR1 se torna mais móvel e o poro pode abrir mais facilmente, ou seja, não funcionar da maneira correta. Esse defeito leva a um 'vazamento' de cálcio, que pode danificar o funcionamento normal dos músculos.

  

(VIDEO 1)

 

(VIDEO 2)

crossmenu linkedin facebook pinterest youtube rss twitter instagram facebook-blank rss-blank linkedin-blank pinterest youtube twitter instagram