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A IMPORTÂNCIA DAS INTERVENÇÕES NO ESTILO DE VIDA PARA O CONTROLE DOS SINTOMAS DA MIOPATIA CONGÊNITA CENTRONUCLEAR

novembro 22, 2025

A IMPORTÂNCIA DAS INTERVENÇÕES NO ESTILO DE VIDA PARA O CONTROLE DOS SINTOMAS DA MIOPATIA CONGÊNITA CENTRONUCLEAR

O estilo de vida levado por um indivíduo afetado por uma miopatia congênita é fundamental para o controle dos sintomas da condição, embora não existam tratamentos específicos para a cura da doença. Essas intervenções são consideradas tratamentos de suporte e visam preservar a função muscular, maximizar a independência, e melhorar a qualidade de vida do paciente.

O tratamento da miopatia congênita deve ter uma abordagem multidisciplinar e individualizada, focada na reabilitação e no suporte contínuo para otimizar a funcionalidade e o bem-estar. Esse estilo de vida a que me refiro, seria sustentado por um tripé de condutas, sintetizado no Controle de Stress, Nutrição, e Atividade Física.

 

Controle do Stress

O controle do stress (stress management) é de extrema importância para a manutenção da saúde e qualidade de vida de indivíduos portadores de uma miopatia congênita. Embora não haja a cura ou tratamento específico para a doença em si, muitas vezes a única terapia indicada é de suporte, como fisioterapia.

Contudo, existem outras condutas que podem ser tomadas visando a mitigação dos sintomas da doença, melhoria na qualidade de vida dos indivíduos, e que inclusive interferem positivamente no prognóstico da doença. Essa conduta diz respeito a uma série de mudança ou incorporação de hábitos vida, chamada de Controle de Stress, e que é composta em vários fatores interligados:

  1. Redução de Carga Fisiológica - Essa redução de carga fisiológica significa minimizar o desgaste físico e metabólico que tanto o stress físico, quanto o psicológico impõe ao organismo do indivíduo portador de miopatia congênita.. O stress crônico (físico ou psicológico), essa resposta contínua e prolongada do corpo a situações de pressão e tensão persistentes pode aumentar a liberação de hormônios como o cortisol, que em excesso, pode ter efeitos catabólicos, ou seja, quebra sobre o tecido muscular, que já está fragilizado pela miopatia.
  2. Prevenção de Exacerbações ou Crises - Algumas miopatias, são sensíveis a "crises de stress metabólico" (como infecções, febre, jejum, ou até mesmo stress físico e emocional intenso). Nesses casos, o controle do stress é essencial para evitar, por exemplo, a precipitação de rabdomiólise (destruição muscular) ou a hipertermia maligna, caracterizada por resposta hipermetabólica após exposição a anestésico inalatório em cirurgias.
  3. Melhora da Qualidade de Vida e Saúde - Viver com uma condição crônica, limitante e, muitas vezes, progressiva, como a miopatia congênita Centronuclear, é uma fonte significativa de stress e ansiedade. O stress management ajuda a lidar com o impacto emocional da doença, o que é crucial para a adesão ao tratamento, a motivação para a reabilitação (como a fisioterapia) e a manutenção de uma boa saúde mental. Uma rede de apoio, por exemplo, é citada como fundamental para aliviar o stress e a ansiedade, proporcionando conforto e compreensão.
  4. Adoção de Hábitos Saudáveis e Não-Físicos - A inserção de hábitos saudáveis e não físicos na vida de um indivíduo portador de uma doença crônica, tais como hobbies, artes, tocar um instrumento musical, e aprendizado de idioma, pode ter um efeito transformador e que proporciona uma melhoria significativa na qualidade de vida e no bem-estar geral. Essas atividades complementam o tratamento clínico e físico ao focar na saúde mental, cognitiva e social, que são constantemente desafiadas pelas doenças crônicas e limitantes. 
  5. O stress excessivo pode levar a um estado de fadiga e tensão muscular, que pode além de agravar a fraqueza muscular já existente causada pela doença, pode também dificultar a realização de atividades funcionais diárias. Ao cuidar do stress, o indivíduo pode otimizar a energia disponível no corpo e a eficácia das intervenções de suporte, como por exemplo a fisioterapia.
  6. Um sono adequado e restaurador desempenha um papel vital na regulação do estresse e das emoções, principalmente através da modulação hormonal e do processamento cerebral, e consequentemente, qualidade de vida.
  • Regulação Hormonal
    • Diminuição do Cortisol: Durante o sono, o corpo naturalmente reduz a produção de cortisol e adrenalina, conhecidos como hormônios do estresse, e promove uma sensação de calma.
    • Equilíbrio da Serotonina: O sono contribui para a produção e regulação da serotonina, um neurotransmissor que afeta o humor e o bem-estar. 
  • Processamento Emocional e Cognitivo
    • Um sono reparador permite que o cérebro restaure as funções cognitivas e lide de forma mais eficaz com os desafios emocionais, reduzindo a intensidade de sentimentos negativos como ansiedade e irritabilidade.
    • Dormir bem fortalece o raciocínio, permitindo que a pessoa lide com situações estressantes de forma mais lógica e menos impulsiva.
    • Noites mal dormidas afetam a regulação emocional, deixando o indivíduo mais impaciente, irritado e com maior dificuldade em lidar com contratempos.

Nutrição

A qualidade de vida de um indivíduo afetado por uma miopatia é fortemente influenciada pela capacidade de manter a funcionalidade e a autonomia o máximo possível, apesar da fraqueza muscular, que é o sintoma mais comum. Neste contexto, a importância do controle nutricional é crítica e multifatorial, sendo uma parte essencial para seu tratamento de suporte. 

No caso específico da Miopatia Centronuclear, por ser uma doença neuromuscular que causa fraqueza muscular significativa (hipotonia), pode levar a várias complicações que exigem um acompanhamento nutricional individualizado e rigoroso, fundamental para minimizar a perda de massa muscular, garantir o aporte energético adequado, e prevenir complicações secundárias à fraqueza. Esse manejo nutricional não visa curar a doença, mas sim otimizar a saúde geral, apoiar a função muscular e respiratória, e prevenir complicações que impactam severamente a qualidade de vida.

Não existe uma dieta ou protocolo de suplementação único para todos os indivíduos com miopatia congênita. A dieta e suplementação deve garantir um aporte energético suficiente para as necessidades metabólicas e para preservar a já tão sofrida massa muscular. O cálculo do gasto energético total precisa ser individualizado, considerando o nível de atividade física e a gravidade da miopatia.

O plano deve ser altamente individualizado e baseado na avaliação clínica, estado nutricional atual e exames laboratoriais. Para garantir segurança e eficácia, as intervenções nutricionais e a suplementação devem ser sempre orientadas por um médico e um nutricionista especializados ou com conhecimento em doenças neuromusculares. Esse planejamento nutricional se baseia em algumas premissas básicas:

  • A ingestão adequada de proteínas é fundamental para o reparo e a síntese de proteínas musculares (anabolismo proteico), o que pode ajudar a mitigar a perda muscular, podendo até promover ganho de massa muscular; 
  • A fraqueza muscular e a redução da mobilidade podem levar a um risco maior de problemas ósseos, como a osteopenia ou osteoporose. A ingestão de Cálcio e Vitamina D é essencial para a saúde dos ossos;
  • O dano muscular crônico pode estar também associado ao aumento do estresse oxidativo, o que acontece também por conta do envelhecimento, situação essa natural de todo ser humano. Uma dieta rica em antioxidantes (presentes em frutas, verduras e legumes), e suporte pela ingestão de suplementação (aminoácidos, vitaminas, minerais, macronutrientes, tais como a proteína, dentre outros), são medidas de real importância para proteger as membranas celulares;
  • Outro ponto vital no controle nutricional é o monitoramento do baixo peso, uma vez que o excesso de peso/obesidade, que pode sobrecarregar a musculatura e o sistema respiratório;
  • Por fim, o controle nutricional é de extrema importância para indivíduos com miopatia congênita, pois como terapia de suporte, visa mitigar complicações secundárias, como por exemplo: 
    • Refluxo gástrico - pela fraqueza dos músculos envolvidos na deglutição (ato de engolir), conhecido como disfagia, o refluxo gástrico pode aumentar o risco de broncoaspiração;
    • Controle intestinal - deve-se evitar a constipação;
    • Controle da lipossubstituição - processo comum em miopatias, e que se trata da substituição de fibras musculares por tecido adiposo (células de gordura), o que faz com que o tecido muscular se enfraqueça mais ainda ;
    • Ganho de peso excessivo - a dificuldade de queima calórica com exercício físico pode levar a aumento de peso excessivo, fator de risco que pode trazer consequências negativas, tais como, diabetes, hipertensão arterial, doença coronária, apneia, restrição pulmonar, dentre outras;   
    • Acúmulo de gordura na região abdominal interfere no centro de gravidade, que atrapalha o caminhar, comprime o diafragma, consequentemente a respiração;
    • Otimização da energia visando evitar a fadiga muscular; 
    • Suporte da saúde dos ossos é de muita importância porque a doença muscular está frequentemente ligada a diminuição de mobilidade, daí um alto risco de osteoporose e, consequentemente, fraturas;
    • Fortalecimento do sistema imunológico - a palavra de ordem para nós, indivíduos afetados por uma miopatia é que evitemos a todo custo contrair qualquer doença, até uma simples gripe, que pra nós pode ser uma grande ameaça, dado ao enfraquecimento causado por qualquer doença, e principalmente pelos riscos de complicação respiratória;

Em resumo, uma nutrição bem planejada e a suplementação direcionada são ferramentas de suporte poderosas que visam otimizar a função muscular residual, prevenir deficiências nutricionais, apoiar a saúde óssea e melhorar a qualidade de vida do indivíduo com miopatia congênita.

 

Atividade Física

Sempre digo que a atividade física, no contexto das miopatias congênitas, vai além da função de mero suporte clínico, pois ela se estabelece como um elemento fundamental na promoção da qualidade de vida. A atividade física é crucial não apenas para retardar o declínio funcional, mas também para promover o bem-estar psicossocial do indivíduo afetado pela doença.

Para indivíduos com miopatia congênita, a atividade física é uma ferramenta terapêutica que busca promover a capacidade do indivíduo agir de forma mais autônoma possível, além de atuar na conexão social e dignidade pessoal, situações estas tão importantes quanto qualquer intervenção médica para alcançar uma qualidade de vida.

A atividade física capacita o indivíduo, dando-lhe um sentimento de propósito, controle e autoestima, que são  um pilares da qualidade de vida.

A Declaração de Consenso sobre Padrão de Cuidados para Miopatias Congênitas, publicada em 2012 no Journal of Child Neurology, tratou a atividade física no contexto de se enfatizar a importância de um programa estruturado, mas altamente individualizado, para manter a função e a mobilidade.

O consenso reconheceu que, embora não exista cura, a fisioterapia e a terapia ocupacional (TO) são cruciais para o manejo da doença, e como promoção da qualidade de vida do indivíduo.

As diretrizes do consenso de 2012 sobre atividade física e reabilitação se referiam principalmente aos seguintes pontos:

  • Foco na Função e Mobilidade
    • Para Manutenção da Amplitude de Movimento, recomenda-se um programa regular de alongamento e exercícios de amplitude de movimento para prevenir ou minimizar contraturas (encurtamento permanente dos músculos e tendões), que são comuns devido à fraqueza e imobilidade;
    • Melhoria da Força e Resistência - O objetivo da atividade física é manter a força e a função muscular residual o máximo possível, bem como aumentar a resistência (tolerância ao esforço) para as atividades funcionais diárias;
    • Prevenção de Deformidades - A fisioterapia e as intervenções ortopédicas são vitais para o manejo da escoliose e outras deformidades esqueléticas que podem impactar a respiração e a postura.

 

  • Atividade Física e Exercício (Em Geral)
    • Individualização é Essencial: A atividade física deve ser cuidadosamente prescrita e monitorada por um fisioterapeuta, neurologista e/ou cardiologista, pois o nível de fraqueza varia muito entre os tipos de miopatia.
    • Evitar o Excesso (Overuse): O consenso alertou sobre a importância de evitar o esforço excessivo (overuse), que pode levar a danos musculares e fadiga extrema. A atividade deve ser realizada em um nível que não cause dor ou fraqueza prolongada.
    • Exercícios Aquáticos: O uso da hidroterapia (exercícios na água) é frequentemente recomendado, pois a flutuabilidade oferece suporte, permitindo que os pacientes se movimentam com mais facilidade e menor sobrecarga articular.

 

  • Uso de Dispositivos e Adapatações
    • A atividade física também abrange a adaptação e o treino com o uso de dispositivos, como órteses (para tornozelos e pés, por exemplo) para auxiliar na marcha e na estabilidade, e o treino com o uso de cadeiras de rodas e outros dispositivos de auxílio à mobilidade.

 

Em essência, a declaração de consenso enfatizou que a atividade física para miopatias congênitas não é uma atividade de "ganho de força" típica, mas sim uma intervenção de manutenção e reabilitação focada em preservar a função e evitar as complicações secundárias da fraqueza, mas sobretudo e principalmente como agente de promoção de qualidade de vida.

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