O RYR1 é um dos maiores genes do corpo humano, e é responsável para o funcionamento dos nossos músculos.
O gene RYR1 (Receptor de Rianodina 1) é um dos maiores e mais complexos genes do genoma humano. Ele contém mais de 100 exons e cerca de 15 mil pares de bases na sua sequencia de DNA, abrangendo uma grande extensão no cromossomo 19. A estimativa é que o gene RYR1 tenha cerca de 2 milhões de átomos, e esse é somente um cálculo de aproximação, pois a quantidade exata pode variar dependendo da sequência específica de nucleotídeos.
Para se ter uma idéia da complexidade do RYR1, ele é imensamente maior e mais complexo do que moléculas simples como da água, tão crucial para nossa vida, e a título de comparação, pasmem ! …o RYR1 tem 2 milhões de átomos, e a água, também conhecida como H20, tem somente 3 átomos.
O gene RYR1 que é crucial para a função do receptor de rianodina, que é um canal de cálcio localizado no Retículo Sarcoplasmático (RS) das células musculares esqueléticas, e desempenha um papel importante no controle de liberação de íons de cálcio para dentro das células musculares, essencial no mecanismo de funcionamento do músculo, especificamente fundamental para o Acoplamento Excitação-Contração (AEC), processo de contração e relaxamento muscular. O processo funciona assim: 1). O sinal nervoso (potencial de ação) atinge o receptor DHPR na membrana da célula; 2). O DHPR, que está ligado mecanicamente ao RYR1, ele é acionado e abre o canal RYR1; 3). O RYR1 aberto libera grandes quantidades de cálcio (Ca2+
) do RS para o citoplasma; 4). O cálcio dispara a contração muscular ao permitir a interação Actina-Miosina; 5). Para o relaxamento, o sinal cessa, o RYR1 se fecha, e rapidamente retorna o cálcio do citoplasma, devolvendo-o ao RS.
Em resumo, o RYR1 atua como o principal portão de saída do cálcio do reservatório intracelular. Ele é o mediador essencial que garante que o comando elétrico do nervo seja traduzido em movimento mecânico, controlando a entrada abrupta de cálcio que inicia a contração e, consequentemente, permitindo que a sua reabsorção finalize o processo para o relaxamento.
Como disse no início deste texto, devido ao tamanho e complexidade do RYR1, mutações nesse gene podem estar associadas a várias doenças musculares, incluindo:
- Hipertermia Maligna - Condição genética que provoca uma resposta anormal causada por algumas drogas anestésicas, resultando em uma rápida elevação da temperatura corporal e problemas musculares, levando ao indivíduo alto risco de morte.
- Miopatias Congênitas - Algumas mutações no RYR1 estão associadas a formas de miopatias congênitas, que são distúrbios musculares que se apresentam desde o nascimento ou na infância, e podem se apresentar com níveis de gravidade diferentes.
O estudo científico do RYR1 é importante para entender essas condições ou doenças, e desenvolver tratamentos adequados em busca de minimizar seus efeitos e sintomas, pensando até na sua própria cura. Além disso, a análise genética pode ajudar em diagnósticos precoces e na prevenção de complicações associadas a essas doenças.
Durante o tempo que tenho acompanhado a movimentação de informações em torno das questões relacionadas ao RYR1, observo um grande esforço da comunidade científica em busca de entender o mecanismo de funcionamento deste complexo e grandioso gene, grande no tamanho, mas sobretudo grande em sua importância. Essas questões fazem com que o desafio ainda seja maior não só por conta dos indivíduos que têm uma doença a ele relacionada, mas também para compreensão sobre o impacto do envelhecimento celular em qualquer outro indivíduo. Observo também um grande movimento de trabalhos sendo desenvolvidos por cientistas de toda parte do mundo em busca de desenvolver uma droga para tratamentos adequados, para de repente ao menos minimizar seus efeitos e sintomas, até sua cura das doenças relacionadas ao RYR1. Particularmente, minha percepção é que as pesquisas através da técnica de reposicionamento de drogas, também chamado de redirecionamento de fármacos têm se mostrado mais promissoras no curto prazo. O “reposicionamento de drogas” se trata de uma estratégia que busca descobrir novas aplicações terapêuticas para medicamentos já existentes, que originalmente foram desenvolvidos para tratar outras doenças. Essa técnica tem a vantagem por seus reduzidos custos, assim como pela redução de tempo gasto no processo de desenvolvimento, e menores riscos no uso da eventual droga, pois já se conhece a farmacocinética e toxicidade do medicamento pesquisado, um exemplo real e prático de pesquisa em curso está se dando com o Sulfato de Salbutamol.
Contudo, a terapia genética também tem se mostrado uma abordagem promissora para o tratamento e cura de diversas doenças genéticas, oferecendo a possibilidade de corrigir ou substituir genes defeituosos. Embora este tipo de tratamento ainda esteja em desenvolvimento e não seja uma solução universal para algumas doenças, como por exemplo certas formas de miopatias ou doenças hereditárias, os resultados das pesquisas têm sido encorajadores. No entanto, a eficácia e a segurança da terapia genética podem variar dependendo da doença, do tipo de terapia utilizada, e condições do paciente. Além disso, questões éticas e de custo também são consideradas importantes. Contudo, enquanto a terapia genética oferece uma expectativa otimista, é uma área em evolução que requer mais pesquisas, altos recursos financeiros, e testes clínicos para se consolidar como a melhor solução para todas as doenças genéticas.
No caso específico das doenças relacionadas à mutação do gene RYR1, a terapia genética apresenta vários desafios, principalmente, como escrito no início deste texto, devido ao tamanho do gene, complexidade das doenças relacionadas a ele, mas também por considerar que os músculos representam aproximadamente 40% da massa total do corpo humano, e a maior parte dessa massa muscular é composta por músculos esqueléticos. Observe a seguir algumas das dificuldades:
- Tamanho do Gene - O RYR1 é um dos maiores genes humanos, o que torna a entrega de sua sequência completa em células alvo uma tarefa complicada. Os vetores virais, usados em terapia genética como meio de transporte, têm limites de tamanho para o material genético que podem carregar;
- Variedade de Mutações - Existem muitas mutações diferentes no RYR1 que podem causar doenças, e cada uma pode exigir uma abordagem terapêutica específica, o que torna o desenvolvimento de uma terapia única para todas as mutações um desafio;
- Alvo Celular Específico - A terapia genética precisa atingir células musculares esqueléticas de forma eficiente. Garantir que a entrega do vetor viral com a cópia funcional do gene RYR1 seja específica para esses tipos celulares é crucial para a eficácia da terapia. Esse conceito é fundamental em terapia-alvo, onde a droga é desenvolvida para interagir especificamente com alvo celular;
- Efeitos Off-target - A introdução de material genético pode ter efeitos indesejados em outras partes do genoma, levando a potenciais complicações, como a ativação de oncogenes ou a inativação de genes supressores de tumor;
- Regulação do Gene - Mesmo que a terapia genética consiga entregar uma cópia funcional do gene RYR1, a regulação adequada da expressão desse gene é essencial. A superexpressão ou a subexpressão do gene pode resultar em problemas adicionais;
- Imunogenicidade - O uso de vetores virais pode desencadear respostas imunológicas no paciente, o que pode limitar a eficácia da terapia ou causar efeitos adversos, tais como respostas de doenças autoimunes, reações alérgicas, dentre outras;
Esses desafios tornam a pesquisa e o desenvolvimento de terapias para mutações no gene RYR1 complexos e exigem abordagens inovadoras e multidisciplinares.
Eu, enquanto portador de uma doença causada pela mutação nesse “grandioso” RYR1, tenho uma relação muito particular com esse gene, e a cada dia que passa o conheço um pouco mais, ..... confira minha próxima postagem intitulada “Eu vi o meu gene em 3D e entendi o que acontece dentro de mim”.